sexta-feira, 29 de agosto de 2014

BRAM



Bram sente que não é Bram. Ele sabe que seu cérebro é remexido durante a madrugada enquanto não está consciente. Pode sentir pontos onde suas sinapses foram trocadas pelos Duendes Mecânicos.

“Até que ponto eu sou eu mesmo? Até que ponto eu tomo minhas decisões?”

É este o tipo de pensamento que passa pela sua mente, pois seu individualismo é roubado pelos Duendes Mecânicos, que fazem o que bem entendem com seus sentimentos. Que chorar, mas seu choro é seu mesmo? Que amar, mas seu amor é verdadeiro? Quer sentir raiva, mas ela é autentica?

Sente saudades de coisas que nunca viveu, mas será que realmente nunca viveu? E se as memórias foram retiradas de sua cabeça? De que lado os Duendes Mecânicos estão? Do Deus-Fungo? Será? E se eles estiverem agindo por conta própria? E se tiverem traído o Deus-Fungo e estão agora ajudando o Maquinista? E o povo com a pele queimada sem coração e com larvas no corpo que vivem no subterrâneo? Porque Bram sonha com o Mundo Posterior, mas também sonha com o Subterrâneo? Não conhece ninguém que sonha com o Subterrâneo.

Imala não sonha com o Subterrâneo, sonha apenas com o Mundo Posterior. Gosta de acordar e olhar Imala dormindo, mas na maioria das vezes é ela quem acorda primeiro. Quando Bram acorda com aquele sentimento de que ainda está dormindo, parece conseguir ver cogumelos em cima da cabeça dela, com tentáculos forçando a entrada em seu cérebro. Bram se indaga se também tem cogumelos invisíveis no topo de sua cabeça.

Os cogumelos com tentáculos são anjos enviados do Deus-Fungo, todos sabem disso, alguns conseguem enxergá-los. Principalmente aqueles que já utilizaram drogas com fungos. Bram não confia no Deus-Fundo, nem nos Duendes Mecânicos e muito menos nas lendas sobre o Maquinista.

Uma vez usou uma droga, difícil de encontrar, com coloração azulada. Em suas viagens encontrou o Maquinista que lhe disse apenas uma coisa:

“Eu estou feliz e eu espero que você também esteja
Eu amei tudo o que eu precisava amar”

Não entendeu o que ele queria dizer falando aquilo de forma cantada, como se fosse uma música.

Bram estava se sentindo estranho naqueles dias, Imala já havia percebido, todos os seus amigos já haviam percebido. Levantou de madruga e deixou Imala dormindo naquela noite, foi até o armário e pegou uma lata de tinta azul. Percorreu ruelas estranhas e escuras sem que ninguém o notasse. Havia pouca movimentação naquele horário.

Bram enfiou a mão na lata de tinta e pintou com a própria mão, estava em transe, não sabia o que estava fazendo. Parou. Afastou-se da suposta obra de arte e leu:

“O céu é azul”

Gustavo Campello

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