sábado, 30 de junho de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE MANIPULAÇÃO



Tento fechar os olhos e não pensar em nada, mas fica cada vez mais difícil cessar o fluxo de pensamentos que rodam pela minha cabeça. Penso no porque das coisas serem como são e de tudo ter acontecido da maneira que aconteceu para que eu terminasse aqui neste determinado ponto do espaço nos meus momentos finais.

Todas as mulheres que eu conheci jamais sairiam com um cara se ele não tivesse um carro bacana e um bom emprego, porém todos os homens que eu conheci jamais respeitaram este tipo de mulheres. Nunca entendi bem isto. O sujeito poderia ser o mais gente boa possível que as mulheres não queriam sair com ele porque ele não tinha um carro, não davam nem chance pra conversa. Pior é que muitas vezes a mulher sai com um cara porque ele tem um carrão e se apaixona por ele, mas o cara não está disposto a correr o risco de ficar com alguém que saiu com ele por causa do seu carro e a deixa chorando por alguma outra. Isto muito provavelmente vem daquela época onde o pai casava a filha dependendo do dote do marido. As próprias regras impostas pela sociedade há centenas de anos atrás ainda vem moldando e manipulando a sociedade de hoje. Creio que por isto nenhum relacionamento da certo, tantas separações e brigas. As pessoas se preocupam mais com dinheiro e interesses materiais do que com o que realmente importa.
            
Mas o que realmente importa?

Porque eu quis ser um astronauta afinal de contas?

As manipulações sociais vêm de todos os lados, família, amigos, escola, televisão, rádio, livros, filmes, músicas, blogs, história em quadrinhos, propagandas, conversas de bar, relacionamentos e tudo mais que nos cerca. Fico imaginando se no fundo eu não acabei virando um astronauta para ter um carro bacana e um bom emprego, talvez eu fosse muito mais feliz tendo um mercadinho na esquina onde eu vendesse frutas e pudesse engordar atrás do balcão com esposa e filhos correndo por ali, mas a sociedade gritou dentro da minha cabeça que isto seria ser um perdedor. Eu não queria ser um perdedor então fui em frente. Estudei e virei um astronauta com um carro bacana e um bom emprego, mas era só o que eu tinha, mais nada.

O problema é que as pessoas nunca param pra pensar no que são manipuladas. Eu nunca parei pra pensar sobre isso. Se as mulheres parassem pra pensar, “Porque é preciso o cara ter um carro bacana e um bom emprego para eu sair com ele?”, talvez as coisas começassem a mudar. As pessoas teriam que parar de pensar só no próprio umbigo e nos bens materiais do umbigo alheio pro mundo começar a andar no eixo de novo.

Aqui no espaço, tão quieto, silencioso e tranqüilo a gente consegue pensar direito, sem a televisão atrapalhando, gritando no nosso cérebro impedindo a gente de pensar com as nossas próprias idéias. Se eu pudesse mandar uma mensagem para a Terra agora seria:

“Desliguem a sua televisão agora e conversem com a pessoa que está ao seu lado, perguntem quem ela é e principalmente perguntem para si mesmos quem são vocês”

Fecho olhos e tento me responder “Quem sou eu?”

Gustavo Campello

segunda-feira, 25 de junho de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE FANTASMAS



Somos todos fantasmas vagando no mundo real do esquecimento.
            
Sem corpo.
  
Apenas memórias que ficarão soltas ao vento enquanto nossas fotografias serão corroídas pela ação do tempo. Ninguém se lembrará de nós em determinado ponto do futuro, nossas ações, felicidades, sofrimentos e obras serão inteiramente decompostas em algum momento da história do universo. Um dia o planeta Terra será simplesmente consumido pelo Sol e seremos apenas poeira espacial. Nada mais. Nada menos.
            
Ninguém se lembrará de mim vagando por este espaço infinito de divagações em meus momentos finais. Serei tão inútil quanto um carrapato para a história humana. Minha mãe ainda se lembrará de mim, meus sobrinhos e meus amigos, mas depois que eles se forem o que restará sobre mim? Meus avós e amigos que já se foram são fantasmas que rondam o meu nome, tendo esperança de que no final eu ainda me lembre deles, de que no final eles ainda tenham tido alguma importância, mesmo que seja ínfima.
            
Posso ouvir meu avô gritando:
            
- Lembre-se de mim – o desespero em sua voz – Eu fui importante!
            
Carregamos vários fantasmas em nossos ombros, a vida é cheia de enterros, um atrás do outro. Vamos ficando mais fortes a cada um deles. A única coisa que não consigo encarar mais com muita naturalidade é o enterro de uma criança. Crianças não deviam morrer nunca.
            
Fico imaginando agora como será meu enterro, já que eles não terão um corpo para enterrar. Provavelmente terá uma solenidade em homenagem a minha pessoa.
            
Quem será que vai? - Gostaria que a Silvana fosse e que meu irmão não aparecesse.
            
Será que vai ter muita gente? - Eu acho que eu gostaria que tivesse bastante gente, que se lembrassem da pessoa que eu fui. As pessoas poderiam contar para as outras momentos que passaram comigo, dessem risadas e chorassem. E eu estaria ali sendo carregado pelos ombros de todas porque agora eu seria um fantasma.
            
Deve ser muito triste ter um enterro com poucas pessoas.
            
Penso na minha mãe e no meu pai, eles vão ficar arrasados, reclamar do emprego que eu escolhi, dos riscos que eu corri, vão tentar culpar alguém que não seja eu. Espero que eles tenham o apoio que precisem pra superar tudo. Gostaria que fosse o idiota do meu irmão no meu lugar. Gostaria de viver.
            
Espero virar um fantasma, como em filmes ou histórias em quadrinhos, poderei ver todos e ninguém poderá me ver. Entrarei nos banheiros femininos e realizarei o sonho de adolescentes. Ouvirei conversas particulares a meu respeito. Descobrirei que pessoas em quem eu confiava falavam mal de mim pelas costas e derrubarei móveis para assustá-los. Serei como uma mosca em seus aposentos.
            
Mas eu não acredito nesse tipo de coisa, penso nessas idéias juvenis apenas para não pensar na morte como ela realmente é. Fantasmas existem, mas não é uma coisa divertida.
             
Fecho os olhos e ainda vejo o meu avô ali, gritando, implorando para que eu não me esqueça dele.

Gustavo Campello

quarta-feira, 20 de junho de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE OS ANIMAIS



Flutuando assim, no infinito, fez com que eu me lembrasse do Duke. Meu peixe dourado que morava em um aquário redondo. Eu devia ter uns seis anos de idade quando ganhei do meu avô, o vidro não continha nem sequer um enfeite e ele ficava lá a flutuar no vazio como eu agora.

Devo ser um peixe aos olhos de Deus.

Duke pulou do aquário quando eu fiquei um final de semana fora com os meus pais em alguma viagem para a praia. Lembro-me de chegar e vê-lo morto, seco e inerte no chão do meu quarto. Chorei. Nunca mais quis nenhum animal de estimação depois que o Duke morreu, estranho como essas coisas afetam uma criança. Fico imaginando agora se a vida dele valeu a pena, ficar em um lugar vazio, flutuando, apenas observando as outras pessoas irem e virem... Vivendo. Talvez a minha vida tenha sido exatamente como a do Duke, talvez aquele peixinho tenha me afetado tanto que busquei para a minha vida exatamente as mesmas coisas.
            
Vazio.
            
Flutuar.
            
Observar.
            
Pessoas indo e vindo.
            
Li recentemente em algum lugar que os animais são os únicos seres que não reivindicam um Deus, mas são os únicos que conseguem viver em harmonia com Ele. Não consigo me lembrar agora onde foi que eu li isto.
            
A pior coisa que a humanidade fez foi descer das árvores. Devíamos ter continuado lá em cima. Macacos. Sem estradas e prédios. Poder pisar na grama, comer frutas, nadar em rios e sentir a chuva batendo em nossos pelos molhados. Definitivamente estragamos tudo. Tudo está podre e estragado hoje.
            
A teoria da evolução é uma grande piada de Darwin, a grande verdade é que estamos involuindo de mamíferos para parasitas. Evolução é a palavra que menos define o ser-humano, seres evoluídos não criam armas de destruição em massa, não juntam riquezas enquanto seus irmãos morrem de fome, não matam por inveja, ganância e pura violência desenfreada. Somos tão imorais e desmerecedores de pisar no planeta onde vivemos... Este mesmo planeta que observo agora, que parece tão calmo e pacífico do lado de fora, tão livre de problemas e parasitas, mas que está morrendo enquanto o seu sangue é sugado aos poucos.
            
Gostaria de ter tido um cachorro, todos os meus amigos tinham cachorros, mas eu nunca quis um por causa do que houve com o Duke. Imaginava chegar em casa e ver o cachorro morto, seco e inerte no chão do meu quarto e logo desistia da idéia de ter um. Minha mãe comprou um gato depois que me mudei de casa, mas nós nunca nos demos bem... Eu e o gato. Era só eu chegar para uma visita que o gato logo fazia de tudo para que eu percebesse que o sofá era dele e só dele. Era como se ele me dissesse “Você deu o fora daqui, agora o lugar é meu!” e eu tinha que abaixar a cabeça e me dar por vencido por um gato.
            
Gatos comem peixes, acho que por isso nunca gostei deles.
            
- Me desculpe, Duke – eu digo em voz baixa – Me desculpe se eu não cuidei de você direito – e continuo a flutuar no vazio como um peixe.

Gustavo Campello

sexta-feira, 15 de junho de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE A PAIXÃO



Stela...
            
Porque me lembrei dela agora?
             
Os cabelos longos e encaracolados, de um castanho claro bem comum nas mulheres que andam por aí. Quando eu tinha meus dezoito anos, ela mudou para a casa ao lado, uma garota de treze anos com as pernas brancas e compridas. Sempre deu em cima de mim, mas achava ela muito nova.
             
O tempo passou, saí da casa dos meus pais e fui reencontrá-la com os meus vinte e seis anos depois do término de uma relação muito complicada. Ela já não era mais tão nova assim. Aquela meninota das pernas compridas tinha virado uma tremenda mulher. Ficamos juntos durante um mês, mas nunca consegui tirar a imagem daquela criança de treze anos da cabeça, acho que por isto nossa relação não deu certo. Nunca tratei ela como uma mulher, sempre agi como se ela ainda fosse uma criança.
            
Um mês parece ser muito pouco tempo, mas as paixões verdadeiras marcam as nossas vidas independente de qualquer coisa.
            
Ela era a garota... Mulher... mais alto astral que conheci. Estava sempre sorrindo, dançando e se divertindo não importando a situação. Colocava-me pra cima. Nunca a levei a sério, ou nossa relação, mas talvez se tivéssemos tido tempo teríamos nos amado. Talvez o amor venha com o tempo e a paixão seja imediatista demais.
            
Ela acabou voltando com um ex-namorado e eu fingi que ela não era tão importante assim. Até agora. Jamais imaginaria que iria pensar nela dessa maneira, com esses sentimentos passando por mim, nos meus momentos finais. Gostaria de ter tido mais tempo com ela.
            
Tento não pensar mais nela, mas logo começo a cantar a primeira música que vem na minha mente.
            
- “Oh, Stella, eu quero te dar o mundo se você ficar comigo está noite. Stella, Stella! Eu quero te dar o mundo se você me abraçar forte. Abrace-me Forte”
            
O que será que ela está fazendo hoje? Será que casou? Tem filhos? Será que ela continua sendo a pessoa feliz e pra cima que eu conheci ou o mundo conseguiu derrubá-la de alguma maneira? Acho que o mundo da um jeito de derrubar todo mundo cedo ou tarde.
            
Cheguei a ficar muito mais tempo com algumas mulheres sem sentir a paixão que senti por ela, gostaria de ter me apaixonado mais vezes, mas sempre estive ocupado demais, fechado demais, contido demais...
            
Olho as estrelas e só então me dou conta que é este o significado do nome dela, tento me convencer de que foi por culpa das estrelas que pensei nela, que ela não foi tão significativa na minha vida assim como estou pensando, mas a verdade é que é exatamente o contrário. Não teria nem sequer percebido as estrelas que me rodeiam neste momento se não fosse por ela, as estrelas não seriam tão belas e luminosas se não fosse por ela, minha vida teria sido bem menos interessante se não fosse por ela.
            
Sinto-me um idiota.
           
Provavelmente ela nem se lembra de mim.

Gustavo Campello

domingo, 10 de junho de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE HEROÍSMO



Em Memória de Ray Bradbury

“Eu não sou um herói!”

“Nunca fui”

Heróis são aquelas pessoas que inspiram outras, que são corretas e que acima de tudo não são egoístas. Não sou nenhuma dessas coisas. Posso ter ido a alguns colégios falar como é ser um astronauta para algumas crianças, mas todo o discurso é puro fingimento.

“Escute aqui garoto” – eu teria dito se fosse verdadeiro – “Ser astronauta não tem nada haver com esses filmes por aí, o trabalho é o maior tédio e passamos a maior parte do tempo nos masturbando para passar o tempo”

Gostaria de cruzar a galáxia com uma arma em punhos como o Flash Gordon. Desbravar um mundo desconhecido como Mongo. Ter um amor como Dale Arden. Um amigo como Zarkov. Um inimigo como Ming com o qual teria lutas épicas.
            
Ser astronauta não foi exatamente como eu havia planejado.
            
Heróis são aqueles que ficam para a história, pode ser o avô de alguém ou um grande escritor. E quando eu digo história não me refiro a enciclopédias velhas e sites na internet. Cada um tem uma história individual. Ninguém se lembra do nome de todos os desbravadores do continente americano, mas muitos foram heróis, outros vilões.
            
Os vilões ficam mais marcados na história do que muitos heróis, Hitler poderia colocar Ming no chinelo. Extermínio em massa. Queimar livros. Controle da mente.
            
“Es geht nicht um eine Neutralität nur im Zweiten Weltkrieg.”
            
Um herói nunca é neutro… Sob nenhum aspecto. Um herói nunca finge que os problemas não existem. Na humanidade realmente há muito poucos heróis. Há vilões demais.
            
Fecho os olhos e tento imaginar a minha fantasia, minhas aventuras, meus inimigos e meus amores extraterrestres. Uma mulher azul com os cabelos alaranjados. Gostaria de uma roupa verde, botas vermelhas e um foguete nas costas, foi para isto que estudei para ser um astronauta.
            
Ser um astronauta nunca fez de mim um herói, eu achei que ia fazer, mas eu estava enganado quanto a isso. Não conheci nenhum astronauta que possa se encaixar no perfil do herói, todos eram pessoas comuns com suas vidas comuns. Provavelmente vão me chamar de herói ao dizer que morri no espaço a serviço da ciência. Vão querer enaltecer minha morte pelas circunstâncias que ela ocorreu. O Instituto vai até conseguir arrecadar um pouco mais de verba em meu nome. Logo serei esquecido, mas servirei ao propósito deles. O Instituto logo me esquecerá e fabricará outro herói, algum outro acidente sabe-se lá onde, é preciso que o dinheiro entre e o setor de marketing é bom no que faz.
            
“Sou um falso herói!”
            
“Ainda não”.
            
“É preciso morrer primeiro pra ser um falso herói”.

“O bom de ser um herói de verdade é que você ao menos pode continuar vivo”.

Gustavo Campello

terça-feira, 5 de junho de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE O RESPEITO



Respeito é a única coisa que todos os seres humanos buscam, sem exceção. E quando eu digo respeito, não confundam com fama, sucesso e dinheiro. Respeito está muito acima disso e nada no mundo realmente importa mais.

Qualquer homem pode viver sem amor sua vida inteira, mas nenhum consegue viver sem respeito. Lógico que nunca seremos respeitados por todos que nos cercam, mas buscamos uma harmonia dentro do possível.

Olho para a minha mão e me lembro de acertar um belo tapa na cara dela. Podem me chamar de covarde. Não sei se eu ligo. No momento não me pareceu a coisa certa a fazer, mas foi o que eu fiz. Foi o que eu tive vontade de fazer. Lhe dei um belo de um tapa. Ela ficou assustada, não esperava que eu fosse capaz, seus olhos se lacrimejaram e a voz não saiu pela sua garganta.

“Covarde! Covarde! Covarde!”

A culpa veio tão rápido como foi embora. Não dava a mínima para o que tinha feito. Não a respeitava, mas ela também não me respeitava. Ficamos juntos dois anos ainda depois de tudo isto. Aprendemos a nos respeitar depois.

Ela virou a mesa em um acesso histérico de ciúmes e eu lhe dei um tapa em um acesso histérico de raiva, acho que nós dois aprendemos com isto. Ficamos mais controlados.

A humanidade em si não tem respeito mais por nada, pessoas jogam lixos nas ruas, passam no sinal vermelho quase levando os pedestres junto com o carro, brigam por qualquer bobagem, atendem celulares durante almoços e jantares, o respeito foi sendo deixado de lado cada vez mais. Acho que por isso as pessoas são tão vazias e depressivas nesse mundo cada vez mais “moderno”.

Tem gente que nem se levanta mais nem para dar o acento para uma garota. “Old Fashion”. Respeito não tem idade. Valores corretos serão sempre valores corretos.

Respeito é diferente de educação. A gente pode ser educado com uma pessoa que não temos o mínimo de respeito. Mas o que é respeito? É uma mistura de educação com admiração, é você tentar jamais machucar ou deixar triste aquela pessoa.

“Silvana” – eu penso nela agora – “Não queria machucá-la e ela não queria me machucar. Tenho certeza disto. Mas acabamos nos machucando do mesmo jeito”.

Tínhamos respeito um pelo outro, mas de nada adiantou, fomos nos perdendo um do outro como grãos de areias escorrendo entre os dedos.

Nunca dei um tapa na Silvana, jamais teria coragem. Respeitava-a. Mas a machuquei mais do que qualquer outra pessoa.

“Burro! Burro! Burro!”

Agora você vai morrer aqui sem poder se acertar com ninguém, seu oxigênio vai acabar e há tanta coisa entalada na sua garganta. Passei tempo demais sem pedir desculpas. Passei tempo demais me desculpando também. Gostaria de me sentir completo agora, sem arrependimentos, digno de respeito.

Gustavo Campello