domingo, 27 de março de 2011

EPITÁFIO PARA O TACO



Vitor estava na casa de seus pais mais uma vez, lembrou-se que foi exatamente ali que começou a escrever seu blog quando não tinha nada melhor pra fazer, com seu sobrinho ao seu lado lhe importunando e algo de podre passando na televisão.

Pensou em tudo o que havia mudado desde então, em como tudo estava tão diferente e de cabeça pra baixo nos dias de hoje em comparação com aquela época.

Ontem o monitor do seu computador havia quebrado, pegou o seu taco de baseball e foi quebrar o maldito como era de praxe. Sempre que algo quebrava, Vitor pegava aquele taco e terminava de arrebentar o objeto, aliviava a tensão, relaxava. Lembrou-se de quando jogava baseball com seu primo Giorgio, que estava morto agora, no quintal enorme da sua casa quando era criança. Lembrou-se de quando seus pais mudaram de casa, aqueles corredores enormes vazios, ele e Walter arremessando fitas VHS velhas e rebatendo com o taco. Mas hoje tudo foi diferente, seu taco perdeu sua primeira batalha, foi de encontro ao vidro grosso de um monitor velho que ele conheceu seu derradeiro fim, sua morte. O taco quebrou-se em dois, Vitor chorou, olhou para o seu antigo companheiro e percebeu que aconteceu a mesma coisa com seus sonhos, com sua vida, quebrada em dois, estilhaçada com farpas de madeiras por todos os lados.

Em uma tarde de domingo ele e o primo ficaram no terreno vizinho desmatando uma selva, imitando Indiana Jones, tudo para achar uma bola que foi perdida por lá. Lembrou-se de que no passado tinha o sonho de jogar na MLB, mas quando amadureceu percebeu que vivia no país do futebol e isso nunca ia acontecer. “Nasceu no país errado” diziam para ele até que um dia ele acreditou. Acompanhava todos os anos o campeonato americano, mesmo que seu time tenha ganhado o campeonato pela última vez em 1998. “Go Tribe” gritava ele vibrando sempre acreditando no seu time até o final.

Vitor queria escrever um bom epitáfio para o taco, mas não conseguia pensar em nada, não bebia nada há 96 horas e apagava tudo o que digitava com a mesma intensidade que seus lábios ficavam secos.

Amanhã iria comprar outro monitor, colar o taco com cola de madeira, mesmo sabendo que ele nunca mais seria usado para estraçalhar outra coisa, mas ainda ficaria ao seu lado, mesmo quebrado, mesmo partido e errado como estava. Afinal era o seu taco, seu companheiro de jogos, de quebrar coisas, não era porque estava inválido que ele iria abandoná-lo agora.

"Deus, como amava aquele taco".

Gustavo Campello

sábado, 26 de março de 2011

COPO VAZIO



Depois do dia de São Patrício, Vitor tinha resolvido ficar um mês sem cerveja ou qualquer outra coisa do gênero, aquilo o estava matando. No começo achou que ia ser fácil, porém depois das 5 horas sem ingerir nada a coisa começou a ficar pesada.

“Só um gole” – pensava – “Não vai fazer mal nenhum um único gole”.

Mas se manteve firme durante mais algumas horas e foi dormir. No dia seguinte seu estresse devido a abstenção era visível por todos os seus colegas de trabalho.

- Eu gosto de azeitona chilena, são as melhores do mundo – dizia Josué, um colega de trabalho – sabia que as azeitonas chilenas são...

- Fodam-se as azeitonas chilenas, fodam-se todas as azeitonas – reclamou Vitor enquanto almoçavam juntos – não tenho interesse nenhum em azeitonas, muito menos chilenas. Vamos mudar pra um assunto mais agradável, conte aí sobre as bocetas chilenas pra variar.

Josué se levantou e se afastou da mesa e Vitor ficou almoçando sozinho pensando nas bocetas chilenas.

48 horas depois já não agüentava mais, tomou um garrafa de cerveja voltando do trabalho, achou que ia ficar aliviado, mas ficou nervoso querendo pedir a segunda. Levantou, pagou a conta e voltou correndo pra casa.

Estava levando a sério esse negócio de não beber por um tempo, seu fígado iria agradecer depois, lembrou de um trecho de Cartas na Rua onde Hank Chinaski dizia que Fitzgerald tinha virado um escritor medíocre depois que parou de beber.

Seria esse o fim de Vitor Scaglia? Se transformaria num escritor medíocre como Fitzgerald?

Aparentemente sim, já que o conto acaba aqui, sem um fim escrito direito.

Gustavo Campello

quarta-feira, 23 de março de 2011

O DIÁLOGO



- O que você mais deseja?

- Nunca ter existido, não ter desejos ou anseio de viver. Acho que é isso.

- Não gosto de te ver assim.

- Não é só você que fica mal, sentindo culpa.

- Desculpe.

- Não peça desculpas, as coisas estão assim por minha causa.

- Não gosto quando você pede desculpas, você pede desculpas toda hora.

- Então porque pediu desculpas?

- Achei apropriado.

- EU FODI SUA VIDA E VOCÊ ME PEDE DESCULPAS?

- Você não fodeu minha vida... bem... não totalmente, talvez um pouco.

- Ah, olhe pra si mesmo, se você tivesse peito igual a mim estaria com uma faca na minha garganta agora. Fodi sua vida sim e de muitas outras pessoas junto.

- Não é verdade, eu gosto de você, me preocupo com você.

- Se eu fosse você eu iria me odiar.

- Te odeio às vezes também.

- Acabei com sua vida.

- Nossa vida!

- Certo.

- Como pretende resolver isso?

- Como você pretende resolver?

- Nem imagino.

- Nem eu.

Baseado no diálogo acima, responda:

1-) Qual dos interlocutores é Vitor?

2-) Qual a relação que podemos fazer de Vitor com a Tsunami do Japão? Justifique sua resposta.

Gustavo Campello