terça-feira, 4 de janeiro de 2011

O QUE É IMPORTANTE?



Vitor estava nervoso.

Fazia um ano que não via sua filha, sentia falta dela, se culpava por estar tão ausente nos últimos três anos. Ela era uma adolescente agora, não era mais aquela criança que ria de tudo o que ele fazia, provavelmente o achava um idiota agora. Tinha medo de encontrá-la, tinha medo de não conseguir falar ou se aproximar dela, tinha medo de ter que encarar que havia se afastado dela porque se lembrava do casamento que não dera certo.

Vitor ligou para Elise dizendo que estava passando para pegá-la:

- Chego aí em alguns minutos, estou nervoso, ela já acordou?

- Ela está arrumada te esperando há duas horas Vitor - disse ela olhando para a menina sentada no sofá olhando para o relógio - ela te adora, não precisa ficar nervoso.

Chegando em frente ao apartamento apertou a campainha e ficou esperando ela descer, estava enorme, quase do seu tamanho. "Que caralho" pensou "Ela só tem treze anos!" Estava linda, abriu o portão, lhe deu um abraço e seus olhos se encheram de lágrimas, na verdade os olhos dos dois se encheram de lágrimas.

- Que saudades - ela disse abraçando o mais forte que conseguia o pai.

- Eu também Princesa - disse ele - vai ficar tudo bem agora.

Foram para o Shopping, ele queria comprar um presente de natal para ela.

- Quer uma barbie? - disse ele inocente.

- Uma barbie? - disse ela rindo - nunca gostei muito de barbies, preferia aquelas bonecas maiores.

- Como assim nunca gostou muito de barbies? Passavamos horas brincando, gastei uma grana tremenda nelas.

Então Vitor percebeu que era mais ele que brincava com as bonecas enquanto ela ria das suas palhaçadas, foram até uma loja e compraram uma Melissa cor de rosa. Agora ela era uma mocinha, já havia dado o primeiro beijo em um garoto, se preocupava com moda, músicas e revistas teens com textos toscos, mas ainda era a sua princesa.

Almoçaram no McDonalds, ela devorou os cinco Nuggets mais rápido do que ele conseguia mastigar um pedaço de hamburguer. Falaram sobre várias coisas do passado e do tempo que não passaram juntos. Um fantasma de nostalgia pairava entre os dois, mas estavam juntos de novo, para os dois era isso que importava.

Gustavo Campello

domingo, 2 de janeiro de 2011

VÁRIAS VIDAS



Ultimamente as coisas andam estranhas, escrevo sobre as mesmas coisas, pareço uma vitrola quebrada. Todo momento da vida da gente é uma etapa, nenhum livro termina se as coisas continuam as mesmas. A vida vem em blocos, cada bloco é um livro, cada livro uma fase ou uma vida diferente. Achamos a vida curta, mas a verdade é que vivemos várias vidas em uma.

Temos a Infância, que é a vida que dura mais, depois que saímos da infância são vidas diferentes sucessivamente, a maioria das pessoas consegue levar isso numa boa, eu não, viver várias vidas em curtos períodos de tempo é um fardo difícil demais para mim. Sempre que morremos, ou seja, quando chegamos em uma fase final da nossa vida é um trauma muito grande, sou uma pessoa que não aceita a novidade com facilidade, principalmente devido a minha depressão. As coisas estão calmas, tranqüilas e PA, como uma cacetada tudo muda, dor, sofrimentos se misturam com a felicidade e a novidade, porém eu não sou a melhor pessoa para viver várias vidas, deve ser por isso que escrevo sobre elas, pra tentar entender, pra buscar algum significado nesse monte de vidas que se misturam em uma só.

Essas novas vidas, ou essas passagens podem acontecer das mais variadas formas, podem ocorrer devido a morte de alguém querido, alguma separação, alguma briga ou até mesmo uma mudança de casa ou de emprego.

“Tudo Morre” já dizia o Garganta Profunda. Quanta verdade! Ele só não sabia que tudo morre mais de uma vez.

Tive um sonho em que o mundo antigamente era habitado por pedras, quando elas iam morrer faziam uma suruba, subiam uma nas outras e PUF, eis que surgiram as pirâmides, grandes monumentos de surubas de tempos remotos. Pesquisadores ficam quebrando a cabeça pra entender essas coisas todas enquanto a vida passa pra todos.

Tenho medo de envelhecer, de esquecer quem eu sou ou quem eu fui, tenho medo de esquecer todas as minhas vidas, todas as pessoas importantes ou não. Tenho medo de olhar pra trás e ver que nenhuma vida foi interessante. Tenho medo de contar verdades quando divago, verdades sobre mim que só eu ou pouquíssimas pessoas sabem.

Michael Stipe canta uma música enquanto eu como um salgadinho de pimenta com um copo de Run. Não era o tipo de coisa que eu faria na minha vida passada, talvez em nenhuma delas, como mudei tanto sem perceber?

Tenho 30 anos e uma filha de 13, algumas pessoas me olham andando no shopping com ela com um ar de reprovação, como se eu fosse algum pedófilo ou algo do tipo. Quando as coisas apertam, quando o mundo parece que vai desabar na minha cabeça é nela que eu penso, na vida antes dessa onde tudo era perfeito, quando éramos uma família. E o que me tornei hoje? Um bêbado desgraçado que nem viu ela crescer e que vai correndo atrás dela ao primeiro sinal de que estou caindo no fundo do poço, cada vez mais para o fundo.

Então ficamos assim, vivendo uma vida nova, sem poder voltar para nenhuma das vidas antigas e com medo da vida que vai vir a seguir.

Vitor Scaglia