quarta-feira, 30 de maio de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE O CRESCIMENTO



Eu sempre fui o garoto inteligente da classe. Aquele esquisito que ninguém convidava para ir às festas, mas o primeiro que procuravam para colar na prova. Acabei virando astronauta e sempre pensei que isto ia fazer com que as pessoas me vissem de maneira diferente, mas agora eu vejo que tanto faz se eu fosse um motorista de ônibus. Estamos todos no mesmo barco, somos seres minúsculos achando que somos importantes em um vasto universo que nem nota a nossa presença.

Crescer com certeza foi a coisa mais difícil pra mim, mas deve ser a coisa mais difícil pra qualquer ser pensante em qualquer parte do universo. Crescer significa que temos que descobrir quem realmente somos, o que queremos, o que pensamos, o que nos faz sorrir e o que nos faz chorar, o que devemos conter dentro de nós mesmos e o que devemos expressar não importa a quem machucamos. Crescer é difícil. Nossos pais e meios familiares muitas vezes mais atrapalham do que ajudam, pois eles querem que sejamos iguais a eles ou melhores. Querem que herdemos seus costumes e seus trejeitos unicamente porque partilhamos uma parcela ínfima de DNA.
  
Hoje meus pais se orgulham de mim.

“E esta é a foto dele com a roupa espacial” – diz meu pai para todas as pessoas que vão visitar sua casa.

“Mas durante o caminho para chegar até aqui ninguém se orgulhava. Ninguém se importava.”

O que ninguém entende é que não sou melhor que ninguém, voltando ao assunto do motorista de ônibus, muitos vão viver muito mais do que eu, muitos vão tocar mais vidas humanas do que eu, muitos vão ser bem mais significativos para suas histórias individuais do que eu. Então qual a grande diferença?

O grande problema das pessoas é que elas não sabem crescer. Crescer não é fácil, mas eu já disse isso.

Não gostaria de voltar ao passado. Algumas pessoas quando estão na beira da morte devem pensar em corrigir algo, em mudar algo ou em fazer algo diferente, mas só de pensar em crescer de novo prefiro deixar as coisas como estão.

Era tímido em excesso quando tinha meus treze anos, qualquer garota me fazia suar e gaguejar ao mesmo tempo. Sentia-me minúsculo, diferente da maneira que me sinto agora contemplando o infinito, de uma maneira muito pior. Sentia-me minúsculo e horrível. Uma abominação. Um monstro insectóide que se alimenta de suco humano. “Corram!” – pensam as pessoas quando me olham – “Fujam!”.

Não sei por que me sentia assim...

Na verdade eu sei...

Insegurança.

Algumas pessoas gostariam de nunca ter crescido e de fato algumas nunca o fazem. Invejo-as. Mas porque uma pessoa como eu, que aparentemente tem um bom emprego, uma boa casa e uma vida estável (Você não tem mais nada disso) inveja essas pessoas que nunca crescem?

Porque crescer é difícil, mas eu acho que já disse isso.

Gustavo Campello

sexta-feira, 25 de maio de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE O PERDÃO



Vagando no universo, completamente perdido, abre algumas feridas antigas. Penso em coisas fúteis das quais nunca fui capaz de perdoar, desde atrasos corriqueiros de meus pais para me buscar na escola até a garota que meu irmão roubou de mim na oitava série.

O perdão é uma coisa engraçada, pensando profundamente agora acho que ele nem sequer existe, é uma desculpa que a gente cria na nossa cabeça pra podermos seguir em frente com nossas vidas.

Mesmo agora perto da morte gostaria de poder dar um belo de um murro na cara do meu irmão, daqueles que arrancam um par de dentes, devia ter feito isto naquela época.

“Nem sequer lembro o nome da garota”

O perdão é uma maneira de mentirmos para nós mesmos e ficarmos bem perante as outras pessoas.

“É lógico que você se lembra do nome dela”

De que adianta mentirmos para nós mesmos? É uma das coisas mais idiotas que os seres humanos fazem.

“Silvana, Silvana, Silvana!”

Acabamos acreditando em nossas próprias mentiras e nos tornamos pessoas moldadas por nós mesmos. Pessoas que no fundo são outras pessoas, nem piores nem melhores, apenas diferentes da nossa essência.

Gostaria de poder me perdoar por não ter sido rápido o suficiente em prender o cabo de segurança, não precisava morrer assim, vagando pelo universo enquanto meu tanque de oxigênio esvazia aos poucos, começo a ter uns espamos, meu corpo treme a cada cinco minutos, é uma maneira de meu cérebro tentar enganar o resto de mim de que tudo vai ficar bem, de que isto não está realmente acontecendo.

“Olhe bem para tudo” – eu penso, sem emitir nenhum som – “Se mantenha são a todo o momento, não perca nada, estes pensamentos que passam pela sua cabeça representam o que você é... O que você foi.”

Olhando para o buraco negro do meu coração percebo que não fui capaz de perdoar, mas diferente do amor, o perdão não faz tanta falta assim no final de tudo.

É difícil pensar em perdão e ignorar a visão de Jesus Cristo que vem na cabeça quando fecho os olhos, mesmo eu que nunca fui religioso acabo caindo neste clichê, achei que seria diferente de todo mundo, mas no fim somos todos iguais. Não importa se está em uma cama de hospital enfermo ou tendo o seu corpo deslocado entre as estrelas, esta coisa religiosa parece grudar em nós como um carrapato, tento pensar em outras coisas e pela primeira vez ouço a minha voz dentro do meu claustrofóbico capacete:

- Pai nosso que estais no céu, santificado seja o vosso nome...

Gustavo Campello

domingo, 20 de maio de 2012

DIVAGAÇÕES SOBRE O AMOR



Enquanto estou flutuando neste infinito com espaços vazios demais entre mim e qualquer outra coisa que exista é que eu percebo como tudo ao meu redor é frio, só então eu me dou conta que termos como “frio” e “vazio” são quase sinônimos da minha existência quando o assunto é o amor.

Cheguei a ser cruel com algumas mulheres é bem verdade, agora me arrependo, podia ter sido feliz com qualquer uma delas. Não que eu preferisse estar agora sentado em um sofá, assistindo ao futebol e acariciando minha enorme barriga com uma lata de cerveja ao meu lado enquanto minha suposta esposa cozinha um filé com fritas na cozinha, não, prefiro mil vezes morrer entre as estrelas do que ter tido uma vida medíocre, não vou ser hipócrita só porque tenho oxigênio para algumas horas, não vou cair naquele clichê barato face a face com a morte, pois nunca desconsiderei os riscos desta profissão, ser astronauta não tem nada haver com minha abdicação do amor.

O amor é uma coisa que nos pega de surpresa, mas não é só a vontade de estar junto com o outro, não é só os prazeres do sexo e muito menos a vontade de perpetuar seu sangue... O amor é principalmente respeito... Teve uma garota por quem acho que fui apaixonado aos meus quinze anos, nunca a beijei, nunca transei com ela, mas podíamos ficar conversando por horas a fio e ambos respeitávamos os sentimentos do outro, talvez ela me amasse, por isso tentou esconder de mim que estava saindo com um cara mais velho, por outro lado talvez eu também a amasse e por isto sempre fiz de tudo para que ela nunca soubesse das garotas com quem eu saía. Acho as vezes que nem sequer desconfiávamos que o nosso amor existisse, foi uma pena, pois acabamos nos distanciando um do outro para que não nos machucássemos.

Aos vinte e dois anos pedi para minha namorada abortar uma gravidez inconseqüente, ela se negou no começo, mas acabei por convencê-la... Não pensei nela e nem no bebê... Só conseguia pensar em mim, não queria ser pai, não queria aquele bebê e principalmente não queria ter que olhar para a cara daquela garota para o resto da minha vida. Pensei durante muito tempo depois como seria a nossa vida se tivéssemos ficado com a criança, isto pesa no meu coração hoje, na hora nem me passou pela cabeça se aquilo teria algum efeito sobre mim ou não. Ela nunca mais quis me ver e o rosto dela me vem a mente nitidamente neste momento, fico imaginando se por algum momento eu a amei.

Existe um amor que passe?

É esta pergunta que me faz acreditar que eu nunca tenha amado ninguém. Talvez só tenha sentido paixão. Sorte daquele que ama, pois quando me faço esta pergunta a única resposta que me vem a mente é “não”, o amor puro e verdadeiro é aquele que perdura pelo tempo, que é infinito como este especo que me vejo vagando agora.

Estou sozinho, mas não quero pensar na solidão.

A única coisa que eu realmente gostaria de ter feito na vida é de ter amado alguém, mas acho que não consegui, espero estar errado sobre isto.

Gustavo Campello

quarta-feira, 16 de maio de 2012

AS CRÔNICAS DE SCAGLIA


As Crônicas de Scaglia são histórias publicadas no blog sobre o personagem Vitor Scaglia, ao todo foram 73, não há a necessidade de serem lidas na ordem correta, porém acho que elas se tornam mais interessante assim. 

Então, segue abaixo os respectivos links das crônicas na ordem correta de leitura, ou seja, na ordem em que foram escritas:

Meu Tio é um Bundão
 







































































terça-feira, 15 de maio de 2012

VAGANDO NO ESPAÇO DE DIVAGAÇÕES



“Burro! Burro! Burro!”

É só o que eu consigo pensar enquanto vejo a estação espacial tomando distância de mim.

“Prender cabo de segurança 1, soltar cabo de segurança 2” – procedimento simples, até uma criança consegue seguir isto, me distraí, fiz besteira... Meu corpo é jogado no espaço e eu me perco, provavelmente para sempre, vou tomando velocidade e logo logo a estação espacial vai ser um ponto ínfimo no meu horizonte.

 “Mas que horizonte...”

Consigo ver o planeta Terra quase como se fosse uma montanha bem próxima a mim, é como se eu pudesse tocá-lo. Fico imaginando se ainda vou poder enxergá-lo quando meu oxigênio acabar. Será que vou ter uma visão de casa quando der o meu último suspiro? Espero que sim.

Quanto devo ter de ar para respirar ainda? Provavelmente umas seis horas, tempo suficiente para me desesperar, meu corpo treme ao pensar que as próximas horas serão as últimas da minha vida. Começo a suar frio e tenho um ataque de pânico, tento me acalmar para poupar um pouco de ar, mas me sinto ridículo em tentar poupar o ar... É tudo uma perda de tempo.

Sinto o meu suor frio escorrendo pelo meu rosto, gostaria de poder limpá-lo, mas o capacete impede que eu o faça, tento esfregar a testa no vidro e obtenho algum êxito. O vidro parece mais frio do que o normal, liso e gelado como o infinito que me cerca. Agora tem uma mancha de suor no meu capacete e atrapalha um pouco a minha visão do lado direito.
Meus olhos começam a lacrimejar, estou chorando, mas é estranho porque não me dou conta do fato. Nunca aconteceu isto antes. Sempre que choro eu sei que estou chorando, porém agora é diferente, é como se outra pessoa estivesse chorando, mas são os meus olhos que estão cheios de lágrimas.

“Burro! Burro! Burro!”

No momento eu tentei prender o cabo com rapidez, mas fui lento como uma lesma... Lembro-me de uma passagem do filme Apocalipse Now onde algum personagem fala sobre uma lesma andando no fio de uma navalha, ou algo que o valha, imagino a lesma se locomovendo e a cada milímetro o corte em seu corpo se aprofundando. É assim que me sinto. Sou a lesma em uma navalha, estou tendo o meu corpo cortado a cada milímetro que me movimento, o problema é que a minha lâmina é infinita.

Observo o planeta Terra e a estação espacial cada vez menores, olho para os lados e vejo as estrelas, sempre estáticas, imutáveis e brilhantes no véu negro que cobre toda a criação.

Então é assim que começa as últimas horas da minha vida, é assim que começo a vagar em um espaço de divagações...

Gustavo Campello