terça-feira, 23 de agosto de 2011

GRIPE, SOPA E UM CONTO INVEROSSÍMIL



-Ta lendo o que? – perguntou Marciolo querendo puxar papo.

- Um conto – responde Vitor lendo.

- É bom?

- Um pouco inverossímil.

- Porque?

- Bem, tem esse cara que trava o diálogo com uma empregada no começo do conto.

- E daí?

- Bem, agora eu to no meio do conto e descobri que a história se passa num domingo... Que porra de empregada é essa que vai trabalhar de domingo? Ou essa mulher vive num regime escravista ou deve ganhar muito bem.

- As vezes o patrão come ela, eles tem algum rolo.

- Não, ele é casado e a empregada fode o porteiro do prédio da frente.

- É – concorda – realmente inverossímil.

Vitor está gripado, não para de tossir e de assuar o nariz, esta de cama e seu companheiro Marciolo é o único que lhe faz companhia.

- Tomou todos os remédios que eu separei pra você? – diz o hipocondríaco Marciolo, seu assunto preferido é sempre remédios.

- Que remédio?

- Deixei na sua cama um Predsim, pastilhas Amidalin e um xarope Percof do lado da sua televisão. O Resfenol está no bolso do seu casaco.

- A pastilha já acabou – disse Vitor tossindo – não agüento mais esse coquetel de remédios.

- Você tem que se alimentar direito – diz Marciolo reprovando os hábitos alimentares de Vitor que estão cada vez mais restritos em salgadinhos e cerveja.

O assunto lembrou Vitor de que estava com fome, era duas da manhã e seu estomago roncava, não havia bebido nada por causa da gripe e conseqüentemente não havia comido salgadinhos. Levantou-se e foi fazer uma sopa, colocou cenoura, mandioquinha e bastante abóbora cabotiã. A sopa demorou uns trinta minutos para ficar pronta, olhou e se deliciou com o cheiro que levantava da panela, a abóbora havia se desmanchado dando mais sustância ao caldo e a cenoura e a mandioquinha boiavam suculentas naquele laranja. Colocou um pouco em um prato, colocou queijo ralado e pimenta, misturou e quando foi dar a primeira bocada acabou queimando a língua. O resto da sopa foi tomada sem Vitor sentir nenhum gosto, agora amaldiçoava sua gripe e sua língua queimada.

Gustavo Campello

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

GUEVARA X BUSH



Vitor morava ao lado da sede do PC do B, logo, várias pessoas que freqüentavam (é, eu ainda uso trema) o local moravam no seu prédio. Parece que aquela moda de camisetas do Che Guevara nunca ia passar, tinha sempre algum mané com ele na camiseta. Tinha camiseta de tudo que é jeito, vermelhas clássicas, brancas, com as cores da Jamaica, com frases dele, estilizadas, aquele puto estava em todo lugar. Não agüentava mais cruzar com aquelas camisetas.

Pra Vitor esse cara não passava de um carniceiro que tinha sede de poder, deixar o país naquela merda que ficou Cuba qualquer um conseguiria. Não conseguia entender porque endeusavam tanto esse cara. Preferia muito mais o Lênin, se fosse pra estampar algum comunista em alguma camiseta Vitor escolheria o Lênin com certeza.

Vitor queria fazer um protesto e resolveu fazer uma camiseta de algum carniceiro também. Lógico que Hitler e Milošević estavam fora do páreo, pois carniceiros étnicos estavam entre os mais odiados por Vitor. Pensou em Charles Manson, mas achou muito óbvio.

Então como uma luz veio a idéia, o carniceiro mais contemporâneo possível, o melhor dos melhores. Vitor fez uma camiseta com o George W. Bush.

Sempre que pegava o elevador com algum cara do PC do B com aquela camiseta do Che, estufava o peito e mostrava seu Bush sorridente com as cores americanas ao fundo, o sujeito ficava vermelho, se contorcia de ódio e saia bufando do elevador, Vitor ria.

Algumas vezes achou que teria que sair no braço com alguém, mas nunca aconteceu. Quando teve uma discussão um pouco mais alterada o sujeito arregou depois de Vitor cuspir no meio da testa do Guevara.

Na rua ninguém entendia direito aquela camiseta, tinha um pessoal que dava risada e tinha um pessoal que ficava sério. Vitor achava de uma tremenda idiotice quem levava a sério aquela camiseta.

Lembrou de uma vez em que passou em uma greve de professores e parou para ouvir o cara ao microfone, era realmente um cara que sabia falar, todo mundo prestava atenção, protestava, gritava, de repente mudou de assunto e começou a falar da vida de Che Guevara. Perdeu o fio da meada, todo mundo nem prestava mais atenção nele.

- MAS QUE MERDA! – Vitor gritou e foi embora pensando que seria uma excelente oportunidade para estar com sua camiseta do Bush.

“Em uma luta entre os dois quem ganharia?” – pensava Vitor – “Já imagino o Guevara todo sujo saindo do mato com aquela escopeta e o Bush num cavalo, chapéu e uma Smith & Wesson no coldre. Seria um duelo interessante.”

Queria mais é que os dois se fodessem!

Gustavo Campello

terça-feira, 9 de agosto de 2011

INGLATERRA EM CHAMAS



O cara da TV diz: “Mais vandalismos marcam o dia na Inglaterra”.

- Yeah!

- Está louco? – diz o pai de Vitor – Acha isto bonito?

- Acho! – diz ele – as mudanças tem que acontecer de alguma forma.

- Eles estão destruindo patrimônio privado!

- Eles estão começando por algum lugar!

- Você está louco!

- Você está pensando exatamente como a mídia quer que você pense.

- Do que você está falando?

- Toda grande mudança no mundo começou com uma onda de violência, desde a extinção dos cro-magnons pelos homo-sapiens. Está na hora do capitalismo cair.

- Você acha que este bando de delinqüentes incendiando lojas é o caminho?

- Isto é só o começo! – Vitor percebeu que seu pai não iria aceitar sua maneira de pensar, mas continuou a pensar mesmo assim – quando o capitalismo cair, provavelmente ninguém vai se lembrar deste bando de delinqüentes que começaram isto, ninguém vai lembrar exatamente como tudo começou, mas se até o império romano ou Alexandria caiu, bem... é muito óbvio que o capitalismo também vai e na minha opinião isto não vai demorar pra acontecer.

- E o que você sugere que estes caras que estão botando fogo em tudo façam?

- Que comecem a queimar bancos, as instituições financeiras são os grandes vírus que nos consomem diariamente. Quando estes banqueiros caírem, estaremos livres.

- Estaremos falidos!

Seu pai não conseguia ver o futuro que Vitor vislumbrava. E daí que os países de terceiro mundo fossem passar fome? E daí que fosse preciso que milhões morressem com a mudança? E daí que houvesse sofrimento? Tudo isto já existia, alguma coisa precisava mudar exatamente pra que essas coisas parassem.

Vitor apoiava a subversão. Vitor apoiava o fogo que queimava bem lentamente o tipo de mundo em que ele vivia e coexistia com seres que ele desprezava que não davam a mínima para o que acontecia a sua volta. Vitor queria que o mundo todo pegasse fogo com todas as pessoas que ouviam e acreditavam no que a mídia dizia. Ele realmente queria que a Inglaterra fosse para o inferno e que ela fosse só a primeira.

Gustavo Campello

sábado, 6 de agosto de 2011

UM ANO!

O BLOG JÁ FEZ UM ANO E EU NEM PERCEBI!

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O ÚLTIMO SALTO DO PEIXE SUICIDA



No aquário de Vitor havia três neons negros, mas um era diferente dos outros dois.

- Cansado desta vida – dizia ele – não agüento mais.

Os outros dois nem davam bola, já haviam se habituado as reclamações dele e sem saberem acabavam deixando-o mais deprimido, sentindo-se sem amigos, sem ninguém para poder contar as coisas, completamente sozinho.

Um dia o pobre peixe pulou do aquário para encontrar a morte, porém Vitor viu e rapidamente o devolveu a água. Os outros dois peixes perceberam que a situação era pior do que imaginavam, mas daquele dia em diante o peixe nunca mais ficou deprimido, achou o que faltava na sua vida, seu objetivo, seu destino, virou um peixe saltador. Amava saltar, mais do que qualquer outra coisa, sabia que era um esporte de risco, mas a adrenalina é o que contava. Pulava para cima, pulava para os lados e às vezes acabava caindo fora do aquário, mas sempre contava com Vitor para devolvê-lo em tempo de sobreviver. Uma vez o pobre peixe teve que esperar Vitor tomar um banho inteiro até ser resgatado.

Um dia ele se preparou para quebrar todas as barreiras do impossível, bater o seu maior Record. Pulou do aquário com toda a velocidade que conseguiu obter, caiu perto da cadeira de balanço atingindo a incrível marca de um metro e três centímetros de distância. Seus outros amigos neons negros, os matogrossos e os neons normais que viviam no aquário deram aplausos, se agitaram e homenagearam o amigo com uma tremenda festa quando ele voltou arfando para o aquário pelas mãos de Vitor. Havia se estatelado, mas logo estaria pronto para mais saltos.

Vitor não sabia mais o que fazer com aquele peixe, pensou em tampar o aquário, mas sorte que não o fez para desespero do peixinho.

Uma noite ele estava pulando de um lado para o outro do aquário para treinar quem sabe uma nova marca, mas um descuido de calculo acabou fazendo com que ele caísse atrás do aquário, Vitor já estava dormindo, o peixe sabia que aquele seria o seu ultimo salto, deu o seu último suspiro e se alegrou com a lembrança de cada uma das vezes que saiu da água indo ao encontro a velocidade.

No dia seguinte Vitor sentiu falta de um peixe, olhou atrás do aquário e encontrou seu peixe seco e com um sorriso imperceptível.

Gustavo Campello