sábado, 10 de dezembro de 2011

SOBREVIVÊNCIA



A irmã mais nova de Vitor ia se casar hoje, ele havia decidido não comparecer, não se dava muito bem com ela e se dava muito menos com um primo que iria estar lá, ia acabar dando bosta. Queria evitar confusão. Desejava tudo de bom para ela, apesar de todos os problemas do passado.

Pensou em como seus pais estavam feliz, em como essas coisas de ter filhos, casar, passar em um concurso público, trabalhar, ter carro, roupas novas e seguir um certo padrão da sociedade enchiam eles de orgulho. Vitor jamais teria isso, nunca iria saber o que era transmitir este sentimento de orgulho para os outros e não entendia porque se sentia tão mal quanto a isso. Ele havia escolhido como seria sua vida, tinha decidido por si só que caminho seguir e estava aguentando as consequências nas costas já fazia muito tempo.

A visão que as pessoas tinham dele é que sua vida era muito boa, cercado de bebidas e com alguns poucos amigos aparecendo na sua casa de vez em quando. Ele não bebia porque a vida era fácil, era exatamente o contrário, ele bebia porque a vida era uma puta de uma filha da puta e beber era a única coisa que fazia com que ela ficasse o mínimo suportável.

Não esperava que ninguém o entendesse mais, só esperava que o deixassem quieto no seu canto, ignorassem sua existência. Sentia como se estivesse involuindo, se transformando em alguma espécie de animal, gostava se sair caminhando pela chuva forte e grunhindo como se fosse um lobo ou um coiote. Sentir a chuva batendo no seu corpo, a noite envolta dificultando a visão, a postura curvada e os cabelos e a barba longa molhados, sentia vontade de gritar e até de atacar alguém qualquer.

Talvez fosse esta sua sina, se afastar cada vez mais da humanidade, ver aqueles seres tão diferentes dele ao longe, como um animal assustado na beira da estrada olhando os carros. Vitor se sentia feliz com quem ele é, com quem ele escolheu ser, mas ao mesmo tempo se sentia triste porque ninguém conseguia olhar para ele e enxergá-lo, ninguém jamais conseguiria compreendê-lo e estaria então sozinho para o resto da vida.

Vitor podia viver com isto.
Vitor podia viver com quase tudo, pois ele é forte como um lobo, poderia sobreviver em qualquer lugar sob qualquer situação... Se quisesse.

Gustavo Campello

domingo, 4 de dezembro de 2011

O VAMPIRISMO DA VIDA PÓS-MODERNA



Eu já reagi a assaltos com facas, já reagi a assaltos com armas, já arrumei brigas na rua, já dormi na calçada e muito provavelmente já matei um homem, bati tanto na cabeça dele que nem me importei depois que me afastei deixando-o lá desacordado. Foi ele quem começou, um tremendo idiota, tentou me assaltar, então não tenho a menor pena.

Pensando nisto mais racionalmente percebo que não tenho o menor medo de morrer e durante muito tempo procurei pela morte meio que sem sucesso, acho que não era a minha hora, acho que as coisas são pra ser como são, ou quando a gente procura demais por ela nos tornamos meio que imunes a certos percalços.

Prefiro morrer do que viver como a maioria das pessoas, do que ser parte da massa de imbecis que de geração em geração ganham cada vez menos para sobreviver e sustentar mega corporações com o custo de seus suores e anos de vida, de robôs condicionados a criar uma suposta sociedade onde tudo o que fazemos é assistir nossas vidas esvaindo-se como grãos de areias entre dedos inescrupulosos de políticos corruptos e aceitar que leis e normas nos mastiguem como urubus e abutres mordiscando carniças.

Prefiro ver minha vida se esvaindo em nada, prefiro estar a parte e dar risada da suposta sociedade ridícula em que eu deveria viver e me contentar, seguindo partituras pré ensaiadas que ditam como eu deveria me vestir, falar, comer ou cagar. Escarro minha escatológica filosofia barata em qualquer um porque é tudo o que eu tenho, é tudo em que acredito, é tudo o que me restou.

E daí que eu nunca vou ser feliz vivendo como eu vivo? Agora eu já vi toda a peça por trás da cortina, não tem mais como entrar em cena e fingir que tudo é real, fingir que eu sigo algum script quando na verdade tudo o que eu faço é improvisar.

Eles podem até sugar o meu sangue, mas pelo menos eu sei que ele está sendo sugado.

Vitor Scaglia