segunda-feira, 28 de outubro de 2013

BULLYING


 
Em Memória de Lou Reed

Da onde vem esta coisa de eu ser diferente? Underground? Gostar de literatura e música que não são assim tão convencionais? Porque eu não leio os Best Sellers mais vendidos? Porque eu não escuto as mais tocadas na rádio?

Estas são perguntas que eu nunca soube responder até este domingo (27/10/2013).

Neste domingo morreu Lou Reed. Mas o que tem haver o Lou Reed com a minha vida e o título desta matéria? Calma, vamos por partes como já dizia Jack, O Estripador.

Em 1992 eu repeti a 5ª série, bombei, fui reprovado. Para minha mãe era algo impensável, completamente não aceito nas regras sociais impostas pela cabeça dela. Sendo assim só havia um caminho a seguir: Eu tinha que ser castigado! Fui matriculado no ano seguinte em um colégio católico, mas que de católico nem tinha tanto assim, estava mais para um colégio de guerra. Não havia nenhum tipo de supervisão, as crianças e jovens que freqüentavam este colégio eram um bando de mimados e filinhos de papai, e mesmo eu sendo mimado e filinho de papai não estava acostumado a conviver com pessoas assim. Minha escola antiga era freqüentada por pessoas mais descoladas que gostavam de rock. Era a fase alta do Heavy Metal e eu já tinha o meu cabelo comprido e minhas camisetas do Metallica. Portanto eu sempre dizia que minha fase do Underground começou antes de repetir de ano... Então, eu dizia para mim mesmo, que os anos que se seguiram não tinham haver com isso.

Não gostava da nova escola e dos novos colegas porque era tudo muito diferente de mim, eu era um nerd que gostava de ler livros de literatura e de boa música, foi então que me tornei um alvo. Perseguido e humilhado. Fazia parte de uma minoria e o único aluno de cabelo comprido no meio de um padrão pré-estabelecido. Abaixavam minhas calças, me davam “cuecão” e as vezes chegavam a atos de violência mais grave como socos, chutes e empurrões. Em casa minha mãe parecia não acreditar muito nas coisas que eu contava, fui me tornando distante, amargo e rancoroso. Aprendi sobre violência, comecei a revidar, brigas constantes. Foi então que eu respirei violência, senti violência, transpirei violência durante quatro anos da minha vida. Dos meus 12 anos até os 15 fui aprendendo a me defender, aprendendo a me distanciar, a odiar. Cheguei a presenciar um estupro de um garoto por dois valentões, abaixaram a calça dele, deitaram no chão e me afastei. Não era da minha conta, a vítima em questão também era cuzão comigo, não ia me meter. Dei as costas e fui embora, mas se mexessem com algum dos meus poucos amigos eu dava a cara pra bater. Havia um garoto que tinha tido uma diarréia que foi perseguido e humilhado durante todo o período escolar da vida dele, ainda é meu amigo, acredito que suas lesões tenham sido ainda piores que as minhas. Briguei, apanhei, sobrevivi ao que considero um período de merda na minha vida. As vezes sentia como se estivesse cumprindo uma pena semi aberta. Mas o que foi que eu havia feito pra merecer isto? Ah é... Tinha reprovado a 5ª série.

Nunca mais fui o mesmo, tem marcas que ficam pra sempre com a gente. Abracei o submundo, fui arrastado para o Underground. Nunca conseguia conversar com uma mulher sem achar que ela ia me achar um idiota, afinal eu não era diminuído por todos que estavam ao meu redor? Tinha medo dela rir de mim e de todos em volta acabarem me taxando de idiota, como na escola. Tinha medo das pessoas. Tranquei-me no meu quarto e só fui realmente sair muitos anos depois, foi preciso muita terapia pra eu conseguir colocar mais ou menos as coisas em ordem.

Quando minha pena encerrou eu escrevi uma redação no último ano que foi uma bomba na família. O tema era: O que vai estar fazendo em 10 anos? Nela eu narrava minhas aventuras com o IRA (Exército Republicano Irlandês) onde todo dia eu explodiria uma bomba em alguma rua para ferir a soberania inglesa em um país ocupado, mas caso eu não conseguisse ir para a Irlanda sempre havia a possibilidade de abrir uma clinica de aborto. Pronto, meu tapa na cara de todos que me obrigaram a ficar estes quatro anos neste presídio estava dado. A madre diretora me chamou pra uma conversa, meus pais foram chamados e todo o colégio ficou sabendo sobre a tal redação. Eu era o demônio, um monstro, algo que rastejava entre os dejetos do colégio. Meu pai chegou a dizer que eu não era mais filho dele... Enfim, quase minha pena foi prolongada, mas finalmente estava livre daquele colégio e minha vida nunca mais foi tão terrível assim.

Mas as cicatrizes nunca sumiram. Sempre me acompanharam. Fazem parte de mim. Meus pais nunca pediram desculpas por me castigarem, inclusive ainda insistem que eu precisava ser castigado. Parei de esperar desculpas e decidi ir em frente.

Mas o que o Lou Reed tem haver com tudo isto? Bem, ele morreu neste domingo e foi só então que eu percebi que gostar de literatura, de ouvir um bom rock e essas coisas todas foi o que me salvou de não ter ficado realmente louco. Lou Reed foi meu salvador, assim como David Bowie, Patti Smith, Morrissey, Neil Young, Iggy pop, Kurt Cobain, Jerry Garcia, David J., entre tantos outros. Conhecendo um pouco a história do Lou, me recordo do fato dos pais dele terem tratado de sua bissexualidade com uma terapia de eletrochoque, não sei se existe correlação entre minha história e da dele, mas só sei que o que eu vivi não foi fácil, não desejaria para nenhuma criança e só quem realmente passou por tudo isto que pode opinar. Não ligo quando ouço “você está exagerando”, apenas sei que não foi fácil quando olho nos olhos do meu amigo que sofreu uma diarréia que selou toda a sua perseguição posterior... Olho a mesma angustia, a mesma tristeza... Seus olhos são espelhos do meu.

Enfim... Mas não respondi a pergunta lá de cima ainda... Da onde vem esta coisa de eu ser diferente? Underground? Gostar de literatura e música que não são assim tão convencionais? Porque eu não leio os Best Sellers mais vendidos? Porque eu não escuto as mais tocadas na rádio?

Acho que ser diferente está no meu DNA, frequentava a casa da minha tia Cleide que tinha sempre boa literatura e boa música e isto começou a fazer parte de mim, entrou nos meus poros. Então o Lou morreu e eu percebi de onde vinha o meu lado rancoroso, todo o meu ódio, meu distanciamento da raça humana, minha dor e meus pesares... E pela primeira vez na minha vida inteira eu percebo que uma coisa não está ligada a outra. Ser diferente não está ligado ao meu ódio, a minha dor.

Depois de 10 anos sumido da mídia, David Bowie lançou uma música intitulada “Where Are We Now?”... E só agora que eu realmente olho para aquele garoto de 12 anos e ele olha para mim, nós choramos, olhando um para o outro e então eu o abraço e depois de muito tempo parece que tudo vai ficar bem. Parece que finalmente tudo está acabando.
 
Gustavo Campello

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

MORRISSEY



Vitor tinha um dilema, ou ele ia no show do Morrissey, um dos seus grandes ídolos do rock oitentista ou ele ia no show da Nina Simone, da qual também era fã incondicional. O dinheiro estava curto e ele teve que optar pelo show mais barato.

Vitor já era um universitário no curso de cinema, estava um pouco desiludido com a faculdade também. Achou que ia encontrar pessoas como ele, mas a verdade é que ele era o único da classe que havia assistido Blade Runner. Todo mundo queria trabalhar nos programas idiotas da televisão. O fato é que Vitor estava bem falido, teve que juntar uma grana pra conseguir o ingresso para o show do Morrissey no dia 4 de Abril de 2000. Iria sozinho.

Aquela turnê, Oye Esteban, não era de nenhum álbum novo. Morrissey resolveu fazer uma turnê mesmo assim porque estava com dificuldade pra achar uma gravadora que bancasse seu novo trabalho. Foi um estouro, onde quer que ele fosse a turnê lotava. Mesmo com toda as exigências absurdas, boatos dizem que ele pediu um motorista mudo pra não encher o saco dele, e tem também o lance do vegetarianismo. Ele não canta se estiverem vendendo carne num raio de tantos metros ou quilômetros.

No portão já dava pra constatar o grau de fanatismo dos seguidores do cantor, além de camisetas, bottons e chaveiros usuais, existia uma fronha de travesseiro com o rosto do Morrissey estampado. Item de colecionador hoje em dia.

Vitor sentou numa roda com alguns fãs do The Cure, trocou uma idéias e quando o show começou conseguiu um lugar na grade. The Boy Racer abriu o show seguida de Alma Matters. Esta última uma das preferidas de Vitor.

- BOXERS! – Vitor gritou pedindo sua preferida, sabia que ele não havia tocado Boxers no show do dia anterior que seu amigo tinha ido, mas não custava tentar. Morrissey porém pareceu nem ouvir e continuou com November Spawned a Monter seguida de Hairdresser on Fire.

- BOXERS! – Vitor se recusava a desistir, ele iria ganhar a música. Morrissey pareceu perceber o pedido e fez cara de blasé.

Não lembra direito que música estava tocando quando percebeu que ao seu lado estava uma garota cega. Aquilo realmente mexeu com ele. No meio daquela multidão, daquele aperto de gente, bem na grade ela estava ali bem ao seu lado. Vitor segurou a menina de um lado e um cara segurou-a do outro e levantaram-na bem ali. Morrissey percebeu que a menina não enxergava e puxou ela para o palco para a surpresa da mesma. Vitor ganhou um aperto de mão do cantor e gritou “BOXERS!”. Ele pareceu rir. A menina teve o seu dia de glória. Chorou e abraçou o ídolo e assim Morrissey conseguiu o status de fodão ao lado de David Bowie junto a Vitor.

Quando Meat is Murder se encerrou Vitor tentou mais uma vez – BOXERS! – gritou a plenos pulmões.

- STOP SCREAMING! – gritou Morrissey de volta enfezado. Parecia que Vitor havia aborrecido o cantor. Pareceu que não ia adiantar nada ficar gritando Boxers, ele não ia mudar a SetList por causa dele. Ficou um pouco triste e Morrissey começou a cantar Lost. Quando a canção chegou ao fim, Morrissey olhou direto pra Vitor e com um sorriso disse ao microfone:

- Ok, Ok! And Now... BOXERS! – Vitor não podia acreditar naquilo.

Losing in your home town
Hell is the bell
That will not ring again
You will return one day
Oh, because of all the things
That you see
When your eyes close

No final das contas, Vitor também teve seu dia de glória.

O show acabou com Speedway, mas ele voltou para uma canja tocando Last Night I Dreamt That Somebody Loved Me.

Saindo do show Vitor conseguiu comprar duas camisetas por R$10,00, elas ainda estão no seu armário e ele só as usa muito de vez em quando. Foi definitivamente um dos Top 5 melhores shows de sua vida inteira.

Gustavo Campello

sábado, 10 de agosto de 2013

BLUR



Era o dia 21 de Novembro de 1999 e Vitor tinha que prestar a prova do vestibular da USP. Era a segunda vez consecutiva que ia tentar fazer aquela prova desgraçada. Estava prestando letras. Naquela época a prova tinha 160 questões que o aluno fazia em dois dias.

Como se concentrar na prova sabendo que no mesmo dia tinha um show do Blur em São Paulo?

- Olha essa concorrência! – Vitor dizia para Jorge que já estudava em uma faculdade pública e estava lhe dando uma carona até o local da prova – Eu nunca vou passar!

- Faz a prova com calma!

- Como se calma fosse me responder reações de oxidação da tabela periódica!

O local estava cheio de carro, Vitor ficou na esquina e foi até a escola a pé. Chegou ao seu lugar e tinha uma garota com cara de inteligente.

- Vai prestar o que? – disse Vitor puxando papo.

- Medicina, e você?

- Medicina? Sério? – houve um silêncio constrangedor – Eu vou prestar letras.

A garota fez uma cara de “Se eu fosse prestar letras passava fácil” que deixou Vitor puto. O assunto morreu aí.

As questões de biologia e química estavam revirando as entranhas de Vitor. Parecia que sua cabeça estava vazia. Sentia-se o mais ignorante da face da Terra. Que porra de perguntas eram aquelas? Pra que diabos ia usar aquilo no curso de letras? Deu uma olhadela na prova da garota da frente... “Ela ta prestando medicina” – pensou. Copiou a primeira questão de biologia dela, eram alternativas, a prova dela tinha as mesmas respostas, mas as questões estavam embaralhadas. Então Vitor copiou a segunda... E a terceira... e foi assim durante toda a prova. Definitivamente ele não confiava no seu taco.

Saiu da prova e foi correndo para a rodoviária, ainda dava tempo de assistir ao show do Blur.

Comprou o ingresso na bilheteria e o show já havia começado. Perdera sua música favorita Country House. Entrou e toda a tensão da prova foi embora, ele estava lá atrás, o palco estava longe e ele foi indo na direção dele, levando chutes, socos, ombradas e cotoveladas. A prova do vestibular não existia mais. Em meio a rodinhas de bate cabeça e o som de guitarra alto ele pulava ao som de Parklife.

Foi só quando a banda tocou Beetlebum que a multidão se acalmou um pouco:

And when she lets me slip away
She turns me on and all my violence gone
Nothing is wrong, I just slip away and I am gone
Nothing is wrong, she turns me on
I just slip away and I am gone

Vitor gritava Country House sem saber que eles já haviam tocado, ele devia ter perdido as três primeiras músicas.

Foi um show do cacete, só ficou imaginando como iria embora pra casa, estava tarde e viu até a Marisa Orth saindo dos camarotes onde os ricos assistiam aos shows. Comprou uma cerveja e conseguiu uma carona até a rodoviária, ainda devia ter ônibus que saíssem pra sua cidade naquela hora.

No final das contas ele passou na primeira fase do vestibular colando da menina que queria medicina. Ele era o Rei das Colas. Um título que devia receber do reitor da universidade na opinião dele, mas na segunda fase não teria uma garota de medicina na sua frente e não sentia a menor segurança de que iria passar em uma boa universidade.

No dia 18 de Dezembro ele passou no curso de Radio e TV de uma universidade particular, foi no mesmo dia que comemorou seu aniversário daquele ano. Marcel, Jorge e Giulio rasparam seu cabelo. Bons tempos. Deve ter uma foto do seu primo correndo com a tesoura atrás dele em algum lugar. Logo depois a banda deles, Caixa Materna, se dissolveu, era hora de crescer.

Muita merda ainda estava por vir.

Gustavo Campello

sexta-feira, 28 de junho de 2013

METALLICA



Quando Vitor fez 11 anos ganhou seu primeiro vinil da sua avó. Era o álbum Ride Of Lightining do Metallica. Seu primo ganhou no mesmo natal o Blood Sugar Sex Magik do Red Hot Chili Peppers. Ouviam os dois discos juntos o tempo todo. Um tempo depois Vitor deixou o cabelo crescer pela primeira vez.

O Metallica tocou no Brasil em 1993, mas Vitor era muito novo e sua mãe não deixou ele ir. Ficou deprimido.

Então quando ele já tinha idade o Metallica voltou! O show estava marcado para o dia 8 de maio de 1999. Já não era mais a sua banda favorita, mas ainda gostava bastante. Umas semanas antes do show seu cachorro ficou doente, era terminal e ele estava deprimido, chegou a pensar em não ir no show, mas Marcel o convenceu do contrário. Foram com uma van com outros amigos. Buda, Inferno, Damião e Cotovelo eram os amigos metaleiros que foram juntos. Chegaram bem cedo e já tinha uma fila.

Ficaram bebendo na fila e Vitor comprou uma camiseta de um cambista.

- Que merda! – disse o Inferno olhando Vitor colocando a camiseta.

- O que foi? – Vitor perguntou intrigado vendo que ele olhava atrás da camisa – ta rasgada?

- Pior!

- Que foi porra?

- Tá escrito Kirk Hammett errado! – realmente estava escrito “Kirk Hamlett”.

Vitor ficou puto e saiu com Marcel pela fila tentando vender a camiseta, mas parece que ninguém tinha dinheiro. Um cara parou eles e perguntou quanto era, Vitor reparou que ele estava uma camiseta do Lobo desenhada pelo Simon Bisley.

- Pra você é de graça se me der sua peita!

Trocaram as camisetas e Vitor ganhou uma camiseta do Lobo que usa de vez em quando até hoje.

Quando conseguiram entrar já tava um bolo de gente perto do palco.

- Vêm atrás de mim – disse Inferno. Ele era um cara muito alto, com cara de mal, gente boa, mas tinha cara desses putos violentos que te quebram a cara se você respirar da maneira errada perto dele. Tinha quase dois metros e era musculoso o filho da puta. Foi abrindo caminho entre as pessoas, um sujeito tentou encarar ele e acabou sendo levantado no ar e jogado a mais de um metro de distância em cima das outras pessoas. Ficamos olhando a cena com olhos arregalados, mas ninguém mais se meteu com a gente.

Sepultura abriu o show, quando o Igor Cavalera bateu na bateria a primeira vez foi o inferno na terra. A namorada de um cara tava sentada nos ombros dele em frente de Vitor, todo mundo se espremeu e a bunda dela entrou na cara dele. Vitor mal conseguia respirar e ficou com a cara enfiada na bunda da mina durante uma música inteira. Quase foi morto em um show do Metallica por uma bunda. Teve que se afastar do palco pra respirar e Marcel foi seguindo ele. Era uma pancadaria só.

Quando o Metallica entrou os caras mandaram muito bem, mesmo sem telão e essas frescuras. Era um show de rock das antigas, a banda tava no palco e só. Tocaram apenas uma música do vinil que Vitor tinha, Fight Fire With Fire:

Fight fire with fire
Ending is near
Fight fire with fire
Bursting with fear
We shall die
Time is like a fuse, short and burning fast
Armageddon is here, like said in the past

Foi quando o tênis de Vitor voou do seu pé, conseguiu abraçá-lo no ar e vestir a meio de trancos e barrancos.

Não tocaram Fade to Black que era sua música preferida. Quando o show acabou as pessoas foram saindo e deu pra ver um mar de tênis sendo deixados para trás. Damião havia perdido um e calçou outro qualquer para não ir embora com um pé descalço.

Na volta Inferno quase matou Vitor porque ele não parava de falar, achou melhor ficar quieto e todos dormiram. Depois que o Jason Newsteed saiu da banda, Vitor achou que o Metallica perdeu a graça, era seu integrante favorito. Dois dias depois seu cachorro morreu e nem se lembrou mais do show.

Gustavo Campello

sábado, 8 de junho de 2013

SUPERCHUNK



Superchunk estava longe de ser uma banda badalada naquele ano de 1998. Estavam se tornando uma importante banda no cenário underground, antes de surgir a moda indie, mas pode-se dizer que estavam no topo entre as bandas independentes da época.

Vitor conheceu a banda através do programa Lado B, que passava tarde da noite na MTV e buscava exibir videoclips de bandas pouco conhecidas. O programa era encabeçado pelo apresentador Fábio Massari que manjava muito de bandas undergrounds como Letters to Cleo, Yo La Tengo, Buck-O-Nine, Pavement, Sonic Youth e Superchunk. Algumas bandas já tinham um certo prestigio lá fora, como no caso de Sonic Youth, mas aqui no Brasil você dificilmente assistia a um videoclip deles fora do programa Lado B.

Quando o Superchunk marcou o show no dia 15 de Setembro de 1998 Vitor já tinha marcado a presença. Vários amigos falaram que queriam ir, mas na hora H todo mundo puxou o carro. Vitor foi sozinho.

Achou que algum outro conhecido podia ter tido a mesma ideia, mas quando chegou na Via Funchal não conhecia ninguém dos presentes. Um grupo de amigos viu que ele estava sozinho e vieram puxar papo. Eram três garotas e dois garotos mais ou menos da mesma idade que ele.

Vitor contou sobre sua banda, Caixa Materna, que estava fazendo alguns showzinhos por aí. Vitor cantava mal e tocava guitarra bem meia boca, seu amigo Marcel tocava baixo e seu primo Giulio a bateria. O que realmente salvava a banda eram algumas letras compostas por Vitor e a melodia de algumas músicas. A banda era boa porque não se levava muito a sério.

- A gente tá tentando montar uma – disse uma das gurias que parecia interessada nele – mas tá difícil.

- Vocês tocam o que? – Vitor perguntou pra ela.

- Rock alternativo, e você?

-Um pouco de Grunge com Punk.

O resto do pessoal que estava com ela era o resto da pseudo-banda ainda não formada. Vitor pegou o telefone da garota, mas nunca teve coragem para ligar de volta.

A primeira banda da noite começou a tocar, se chamava Wry e era de Sorocaba. Vitor acabou vendo vários outros shows desta banda no futuro e conversou algumas vezes com o vocalista Mario Bross pelos bares da vida. A segunda banda a tocar foi o Pin Ups que Vitor já conhecia e adorava. Alexandra Briganti era ainda mais bonita ao vivo e mandaram muito bem.

Então o Superchunk entra no palco para fechar a noite e Vitor parece ser transportado para outra dimensão onde as leis da física não se aplicam mais. Seu rosto é acertado por pés, uma pessoa parece que caiu do teto enquanto voava, uma bunda se materializa a sua frente e lhe acerta ao lado do rosto e em alguns momentos ele não sabe se está em pé ou de ponta cabeça.

Ele pula como um louco!

É o melhor show de todos os que viu até agora!

Quando o Superchunk começa a tocar Precision Auto vai todo mundo a loucura:

Do not pass me just to slow down
I can move right through you
Do not pass me just to slow down
I have precision auto

No meio da música uma corda do baixo de Laura Ballance arrebenta e a banda continua a tocar no improviso. Calmamente a gatíssima baixista pega uma corda nova, coloca e a afina com um fone de ouvido gigante na cabeça. Enquanto tudo isto acontece a banda improvisa uma verdadeira aula de rock sem sair da música. Então a banda inteira se entreolha e voltam a tocar juntos do ponto onde pararam:

I see you way too slow
I see you in slow motion
You've got muscles--use them

Vitor pula e acerta com o ombro o queixo de uma garota sem querer. Ele percebe que ela cortou a língua com o impacto e é arrastada para a enfermaria. Um pouco de sangue mancha sua jaqueta. Ele se preocupa com a garota, mas agora não há nada que ele possa fazer. O show tem que continuar e o Rock ’n’ Roll rola solto.

Na saída Vitor compra o álbum Lee Marvin do Pin Ups que estava a venda e volta para a casa sem saber que Superchunk seria a banda internacional que mais assistiria shows em sua vida.

Gustavo Campello

segunda-feira, 27 de maio de 2013

FERREIRA GULLAR X ARTE CONTEMPORÂNEA



Em Janeiro deste ano saiu uma entrevista com o poeta, crítico de arte, biógrafo, tradutor, memorialista, ensaísta e um dos fundadores do neoconcretismo, o Sr Ferreira Gullar.

A entrevista você pode ler na integra no link abaixo:


Nela o Sr Gullar transcorre sobre arte. Fiquei um tempo pensando sobre o assunto e resolvi escrever um texto para o blog. Acho que é a primeira vez que eu publico algo assim por aqui. Li a entrevista e os comentários de algumas pessoas e me espantei em como a grande maioria defende com unhas e dentes o poeta. É muito fácil ser meio “Maria vai com as outras” quando um cara de renome como o Ferreira Gullar expõe alguma idéia, eu mesmo até certo ponto do texto estava sendo levado até o momento em que ele critica o artista plástico Joseph Beuys, do qual sou um grande fã. A partir daí já comecei a ler o restante da entrevista com outros olhos.

Gullar afirma que nem todo mundo pode fazer arte e que existe uma diferença entre arte e expressão. Bem, sou apenas um mero aspirante a escritor com cinqüenta anos a menos do que ele, mas não posso simplesmente concordar com isto. Não quero me auto-promover com este texto criticando um grande escritor brasileiro, mas ao meu ver, o que o Sr Ferreira Gullar disse nesta entrevista é uma tremenda bobagem.

Joseph Beuys disse que todo mundo pode fazer arte, Ferreira Gullar rebate que não e dá exemplos como “Nem todo mundo pode jogar bola como Zico” ou “Nem todo mundo pode tocar Bach”. Verdade, eu não jogo bola como o Zico, na verdade eu nunca devo ter chutado uma bola porque nunca me interessei por jogar futebol, simplesmente não fez parte da minha vida tal coisa. Já brinquei no piano da minha avó quando era pequeno e também nunca me preocupei em tocar Bach. Isto não significa que eu não tenha a capacidade para isto. Poderia ter jogado bola como o Zico se eu tivesse me esforçado para isto. Todo o ser humano pode alcançar o seu potencial, acredito nisto.

Acredito que escrevo bem, alguns familiares pensam que é um dom e blá blá blá, mas eu tive que ler muito Hemingway, Dostoiévski, Bukowski, Fante, Kafka, Garcia-Marquez, entre outros para conseguir escrever razoavelmente bem na minha concepção. Acredito que ainda tenho muito que ler pra chegar onde eu quero. Posso nunca chegar a escrever como o Hemingway, tudo bem, mas não significa que o que eu escrevo não é nada, não vale nada e não é arte.

Em um dos comentários, uma usuária do Instituto de Artes da UNESP chamada Beatriz Ruco consegue simplificar todo o meu argumento: “Ele falou coisas das quais compartilho como obras que não fazem o menor sentido, não atingem nenhum objetivo e são defendidas por críticos que fazem menos sentido ainda.Isso me lembra o porco empalhado , obra de Leiner.
Porém não sou eu e muito menos o grande Ferreira Gullar que pode definir o que é e o que não é arte, podemos apenas não gostar do que vemos. Queria ainda lembrar que discordo totalmente desse pedestal em que colocam o artista, como se ele fosse um ser iluminado pelo dom. Acredito que sim, qualquer um pode fazer arte (alguns com mais facilidade) ou seria inútil estudar a forma, o desenho, a pintura e deixaríamos tudo por conta do dom.”

Eu, particularmente, odeio Picasso. Não me agrada olhar para os quadros dele. E aí? Só porque eu não gosto de Picasso ele não é arte para mim? Quem dita o que é e o que não é arte? Adoro os quadros do Pollock, tem gente que odeia. Pode algo ser arte pra mim e não ser arte pra outra pessoa? Arte é arte e pronto. Nem tudo vai descer redondo pela garganta de todo mundo.

Pelo discurso do Gullar poderíamos então jogar no lixo a arte de Marcel Duchamp? Teria ele feito mal para o mundo das artes? Certa vez o escritor Paulo Coelho declarou que James Joyce fez mal para a literatura, achei de um tremendo mal gosto este comentário. Ao meu ver, se Joyce fez mal a literatura, fez bem menos mal que o Sr Paulo Coelho. Esta entrevista parece seguir o mesmo caminho. Ferreira Gullar dizendo que Beuys e Duchamp fizeram mal para as artes plásticas. Quem é ele para dizer isto?

Duvido que meu estilo de literatura agrade ao Sr Ferreira Gullar, devo ser enxotado como escritor por isto? Não quero um Prêmio Nobel e muito menos um lugar na Academia Brasileira de Letras, mas sou um escritor sim. Respeito é bom e eu gosto. Odeio os livros do Paulo Coelho, mas que direito eu tenho de dizer que o que ele escreve não é literatura? Posso até chamar de péssima literatura, mas ainda assim é literatura.

O porco empalhado de Leiner pode até ser chamado de péssima arte por quem não se sentir agradado por ele, mas não deixa de ser arte. Já vi várias performances por aí, nunca entendi direito elas e já até rendeu uma crônica chamada Arte Transgressora. De todas que vi, gostei só de uma. Quem sou eu pra dizer que arte performática não é arte? É preciso que alguém pinte a performance para que seja arte? Desculpem-me, mas a visão de arte de Ferreira Gullar está muito limitada na minha opinião.

Gullar ainda diz “Vídeo bom é aquele que narra al­guma coisa”. Sou fã do David Lynch e também sou obrigado a discordar desta frase. A imagem pode nos tocar com sentimentos sem que seja uma simples narrativa. O vídeo pode ser usado sim como algo muito maior do que uma simples narrativa.

Espero não ter falado bosta demais, sou apenas um apreciador de arte, conheço muito pouco, meu negócio é mais a literatura mesmo. Achei que minha opinião sobre o assunto fosse acrescentar algo a discussão.

Pensem sobre o assunto!

Gustavo Campello

segunda-feira, 20 de maio de 2013

U2



O U2 estava com a turnê Pop Mart explodindo de público por onde quer que passasse. Era uma febre! Os ingressos esgotavam rapidamente. Vitor e Marcel queriam ir neste show a qualquer custo, mas não haviam mais ingressos.

Vitor começou a escutar U2 quando a banda havia lançado o álbum Zooropa, quatro anos antes do lançamento do álbum Pop que rendera a turnê Pop Mart que estava em questão. Foi seu primo Giulio que comprou o Zooropa em 1993 e que Vitor havia gravado em uma fita K7 que ficava tocando em seu walk-men enquanto descia para a praia todo o final de ano com sua família. Foi esta fita K7 que o salvou de horas dentro de um carro tocando músicas chatas de dancing que sua irmã adorava.

Foi Marcel que viu no jornal uma empresa de turismo oferecendo um pacote completo para o show. Estava incluso o ingresso e transporte. Perfeito! Foram até lá e fecharam tudo por uma pechincha. O ingresso era para as cadeiras numeradas, mas estava ótimo já que estava difícil conseguir ingressos por aí.

Vitor ficou puto quando descobriu que suas duas primas haviam comprado um ingresso para ir. Elas nunca haviam escutado U2 na vida. E foi assim por todos os lugares, as pessoas não iam por causa da banda, mas sim por causa do evento. Não importava se a pessoa nunca havia escutado U2, a turnê tinha a maior televisão do mundo. VÃO SE FODER pensava Vitor.

No dia do show tudo correu perfeitamente bem, a empresa de turismo não era um golpe, os ingressos eram reais e estavam no Morumbi no dia 30 de Janeiro de 1998 como tudo fora planejado.

Chegaram de tarde, havia muito tempo para o show. Vitor e Marcel como bom corinthianos cuspiam no símbolo do São Paulo toda vez que passavam por ele. Foram até a cadeira numerada que estava marcada em seus ingressos e sentaram ao lado de um velho com o cabelo rosa. Vitor pensou em pintar o cabelo de rosa também, mas nesta época tinha o cabelo pintado de amarelo. Tomaram uma cerveja e foram atacados por um enxame de abelhas. Pisotearam todas.

- Esta cadeira numerada é uma bosta – disse Marcel.

- A gente precisa ficar aqui?

- A gente podia ir lá no meio da multidão, afinal nosso ingresso é mais caro que a pista.

- Vamos lá!

Vitor e Marcel foram até a pista onde se aglomerava um monte de gente e ficaram mais perto do palco que se ficassem nas cadeiras numeradas.

- Cadeira numerada é pra idiotas! – disse Marcel feliz com a nova posição que conquistaram.

- Pra idiotas que tem medo de multidões – Vitor lembrou-se que suas primas iriam ficar nas cadeiras numeradas e completou – e pra idiotas que só vieram pra ver a maior televisão do mundo.

Uma bandinha ganhadora de algum prêmio chamada Bootnafat começou a tocar. Até que era bem legal. Tocaram Killing in The Name Of do Rage Against The Machine e aparentemente só Vitor e Marcel pularam e se divertiram no meio de toda aquela gente. Público pop é foda!

Quando entrou o Gabriel, O Pensador a galera foi ao delírio, só porque era um babaca vinculado pela mídia. Vitor sentou no chão e aproveitou pra descansar enquanto o babaca cantava contra o sistema e enchia o bolso de dinheiro com o mesmo sistema.

U2 entrou e foi um puta show! Não há como explicar aquela televisão enorme mandando um monte de imagens direto pro seu cérebro enquanto o U2 tocava músicas de uma época em que ainda inovavam alguma coisa no rock. Vitor preferia a fase mais eletrônica deles que começou no álbum Achtung Baby, mas Marcel era mais tradicional e preferia o álbum Joshua Tree.

Para Vitor o ponto alto do show foi quando tocaram Hold Me, Thrill Me, Kiss Me, Kill Me:

You don't know how you got here
You just know you want out
Believing in yourself almost as much as you doubt,
You're a big smash
You wear it like a rash
Star.

O ponto baixo foi tocarem Sunday Bloody Sunday em versão acústica. Esta música era baseada no Domingo Sangrento, um confronto entre manifestantes católicos e protestantes, e o exército inglês na Irlanda do Norte no dia 30 de Janeiro de 1972. Houve 14 fatalidades entre os ativistas católicos e 26 feridos. Naquele exato dia o Domingo Sangrento fazia 26 anos e quiseram tocar com um tom melancólico. Vitor e Marcel queriam o som forte da bateria e da guitarra, mas tiveram que se contentar com o que tiveram.

Quando o show acabou eles estavam simplesmente suados e morrendo de sede, havia caído uma garoa que não atrapalhou o show, mas que com certeza traria uma gripe. Chegaram no ônibus e não havia mais água. Vitor pegou uma pedra de gelo e a mastigou. Seus dentes sempre foram de aço, mastiga gelo como se fosse gelatina. Todo mundo olhava pra ele dando risada, a pedra de gelo era do tamanho de uma maça.

Houve outras duas passagens da banda pelo Brasil, uma em 2006 e outra em 2011, mas Vitor não conseguiu ingressos. Em 2006 ficou ligando que nem um louco porque as vendas eram por telefone. Perdeu horas da sua vida e ficou puto. Em 2011 queria mais é que se fodessem, não iria ficar atrás de ingressos que nem um louco e ainda por cima pagar uma fortuna.

Sentia falta da pegada eletrônica da banda, eles ainda faziam um rock excelente e honesto, mas faltava inovação, como quase todas as outras bandas das antigas que haviam ficado por aí.

Gustavo Campello

quarta-feira, 1 de maio de 2013

BUSH



Vitor começou a escutar Bush desde que lançaram seu primeiro álbum, Sixteen Stone, comprou o CD em uma loja que vendia várias coisas importadas de bandas de rock. Eles não estouraram no Brasil até que lançassem o segundo álbum, Razorblade Suitcase, foi quando a banda veio fazer um show e Vitor com certeza estaria lá.

Marcel não era um grande fã da banda e resolveu não ir. Bush era uma banda inglesa que talvez fosse o último suspiro do grunge para Vitor. “Banda inglesa fazendo grunge?” – pensava Marcel – “Não dá muito certo isso!”.

Vitor decidiu ir sozinho.

Um dia antes o David Bowie havia tocado em São Paulo em um festival patrocinado por uma pasta de dente, mas nesta época Vitor não levava a música tão a sério. Se arrependeria pelo resto da vida por ter preferido ir ao show do Bush. David Bowie viria a se tornar seu cantor preferido anos mais tarde.

Conheceu um pessoal assim que chegou. Um cara da idade dele e uma garota uns sete anos mais velha. Era o dia 10 de Novembro de 1997 e a garota mais velha havia assistido ao show do David Bowie.

- Fui ontem no show do Bowie – falou ela toda orgulhosa.

- Grandes merdas ir no show do Bowie – replicou Vitor – depois todo mundo que gosta do Bowie é viado mesmo.

- Bowie foi o cara mais importante pro rock na minha opinião – disse a garota rindo e levando o comentário na esportiva.

A verdade é que Vitor era um homofóbico babaca criado por uma sociedade preconceituosa nesta época. Foi só depois de muito tempo que conseguiu deixar seus preconceitos e valores retrógrados pra trás graças a um vizinho homossexual que conseguiu fazer com que Vitor finalmente abraçasse a literatura como o maior sentido de sua vida.

A banda finalmente entrou no palco e Vitor estava relativamente bem próximo da grade de segurança. As garotas soltaram gritinhos histéricos por causa do Gavin Rossdale, vocalista e guitarrista que era tido como o galã do rock do momento.

O melhor momento do show foi quando começaram a tocar Little Things:

going up
when coming down
scratch away
it's the little things that kill
tearing at my brains again
the little things that kill
the little things that kill

Gavin Rossdale chegou próximo a grade com sua guitarra e uma multidão puxou ele pela roupa, gruitarra e até pelo cabelo. Vitor pulou para próximo da grade e segurou bem firme na guitarra dele. Gavin ficou meio assustado, mas logo todos o soltaram, menos Vitor.

- Fuck Off! - disse o líder da banda.

-Dá essa porra de guitarra – gritava Vitor se divertindo como nunca – eu quero a porra da sua guitarra!

-Son of a bitch!

-Dá a guitarra!

Gavin tentou dar um chute em Vitor, mas seu pé bateu na grade. Os seguranças ficaram um tempo sem reação e vieram tentar ajudá-lo. Vitor queria a guitarra a qualquer custo.

Por fim Vitor teve que largar a guitarra e a música continuou depois de um tempo de improviso do resto da banda.

As pessoas arrastaram Vitor para longe da grade, algumas estavam rindo da situação, outras estavam com raiva porque a música havia parado e outras aplaudiam Vitor como um autentico grunge encrenqueiro dos anos 90.

Acabando o show Vitor comprou uma camiseta. Foi a primeira camiseta de turnê que Vitor comprou, ele a mantém guardada no armário até hoje.

Gustavo Campello

quarta-feira, 10 de abril de 2013

THE OFFSPRING



Era a turnê do álbum Ixnay On The Hombre e a banda estava no momento de maior sucesso de sua carreira. Eles são uma banda de Hardcore Californiano que estão na estrada até hoje. Haviam anteriormente lançado o álbum Smash, que é até hoje o álbum independente mais vendido no mundo. Uma empregada, certa vez, levou embora uns CD’s que estavam empilhados em cima do som. Vitor nunca mais viu seu álbum Smash do The Offspring, sumiram também as trilhas sonoras dos filmes Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes e 007 O Mundo Não É O Bastante.

“Empregada de sorte” – pensava Vitor quando se lembrava do ocorrido – “Levou o melhor CD do The Offspring e a trilha sonora do Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes que era uma edição limitada que eu paguei uma nota preta!”

O show havia começado e Vitor conseguiu fingir que a garota não havia dado em cima dele. Quando você vai em um show de rock, pode até acontecer de pintar um clima com alguma garota, mas na hora que a banda principal entra no palco, nada mais importa. Você está lá para ver o show, não para ficar com garotas, você quer cantar, pular e ouvir uma banda que você gosta muito ao vivo, perceber como as músicas soam ali naquela hora. Se você quisesse sair para pegar garotas estaria em outro lugar com certeza.

Uma das músicas preferidas de Vitor, What Happened To You? foi a melhor vista ao vivo. Era uma música que falava sobre um cara se destruindo com as drogas. Vitor nunca ligou para drogas, achava uma besteira, foi só depois de muito tempo que foi perceber que álcool também se classificaria como uma droga e foi esta droga que quase destruiu a vida dele em uma tentativa fracassada de autodestruição.

Pediu mais uma cerveja enquanto o show rolava solto. Ele estava todo suado já. Seu cabelo cumprido estava um nojo. Parecia que ele havia acabado de sair do banho.

Para surpresa geral da nação ouve um cover do Nirvana que levou todo mundo ao delírio, pois apesar do grunge já ter morrido há alguns anos atrás, muitas pessoas ali ainda tentavam mantê-lo vivo. Ninguém esperava também um cover pequeno do Metallica assim que a banda voltasse para o bis. Metallica foi a banda que introduziu Vitor no rock, mas isto é assunto para outra crônica.

Sitting on the bed
or lying wide awake.
There's demons in my head
And it's more than I can take.
I think I'm on a roll
But I think it's kinda weak.
Saying all I know is
I gotta get away from me

Este trecho da música Gotta Get Away era quase uma profecia para a vida de Vitor. Dez anos depois deste show Vitor estaria terminando seu casamento. Depressão. Bebida. Tristeza. Tudo isto faria parte dele durante muitos anos.

Mas quando o show acabou ele só queria saber qual era o nome da garota que ainda não tinha perguntado.

- Qual é o seu nome?

- Rafaela. E o seu?

- Vitor, Vitor Scaglia – ele falava o nome completo porque achava que soava bem.

- Provavelmente a gente nunca mais vai se ver – ela disse.

- Verdade.

- Não quer me dar um beijo?

E eles se beijaram só uma vez antes de irem embora.

Foi um excelente show

Depois disso Vitor cortou o cabelo comprido e pintou o cabelo de amarelo tentando ficar parecido com o vocalista da banda. Era o único cara com o cabelo pintado da cidade. Chamava a atenção. Depois os pagodeiros começaram a fazer isto e Vitor logo mudou o visual. Quando estava crescendo e ficou meio amarelo e meio castanho ele achou mais legal ainda porque ficou parecido com o Layne Stanley do Alice in Chains. Se recusava a assistir o grunge morrer.

Gustavo Campello