“No fundo
a gente só começa a viver mesmo depois que perde o medo de ir para o Inferno” –
pensava Vitor entre seus botões – “A gente vai vivendo até que cria colhões pra
chegar para Deus e mandar ele ir se foder pela merda de vida!”
Este era
um ponto importante na vida de Vitor, o momento em que ele se desconstruía e
virava uma nova pessoa, sem medo, sem aflições, sem sonhos e sem futuro. Pode
ser apavorante pensar em algo assim, mas o que ele sentia era na verdade um
grande desprendimento de tudo, inclusive de sua própria vida.
Teve a
idéia de fazer uma “Última Ceia” com seus amigos, ligou para Jorge, Adamastor,
Mario, Carla, Marcel e Larissa... Nenhum realmente parece ter entendido direito
a situação e já tinham seus respectivos compromissos para o fim de semana.
Olhou
para a arma em cima de sua cama.
Como
estava cansado de sentir culpa por quem era, sentia culpa por não gostar de sua
própria família, sentia culpa por ser diferente das outras pessoas e sentia
culpa pelos caminhos errados que havia decidido seguir durante sua vida. Queria
ser quem ele era, sem culpa, sem desculpas e se era difícil pras outras pessoas
entenderem que ele era assim... Bem... Paciência!
Pegou a
arma e brincou com ela, rodou entre os dedos, jogava para o ar e pegava com a
outra mão, havia aprendido vários truques com os filmes de faroeste, mas jamais
imaginava que eram tão fáceis de por em prática apenas memorizando os
movimentos com a mente, porém descobriu que era praticamente um malabarista com
a arma em punho.
Olhou uma
última vez para os pôsteres do John
Wayne pela sua casa, se
despediu do aquário e de seus pertences mais insignificantes. Tocou o apito com
certo pesar e abraçou o manati de pelúcia que se chamava Herman com carinho.
Marciolo
estava dormindo e Vitor achou melhor assim... Não queria perturbá-lo com nada.
Vitor
Scaglia tinha um plano, podia ser um péssimo plano, mas ele não ligava, iria
com ele até o fim. Parou de se importar com o que sua família ia achar, com o
que seus amigos iriam falar ou qualquer outra coisa que pudesse acontecer.
Sabia que não ia ser fácil se despedir de tudo, por isso havia virado vários
copos de vodka, mas mesmo assim as coisas não estavam saindo como planejado,
seu coração ainda estava apertado.
Segurou
bem firme a pistola com a mão direita, apesar de ser canhoto, usava a mão
direita para todo o resto que não fosse escrever. Sentiu o metal frio contra
sua pele e levou o cano até o céu da boca para ver qual era a sensação de poder
acabar com tudo tão fácil, tão rápido e tão indolor quanto era possível. O
gosto do metal inundou sua boca e Vitor sorriu.
Afastou
bem vagarosamente a arma do rosto, engatilhou e atirou sete vezes, que era o
número de balas que tinha, bem em cheio no seu computador... ele estava
completamente destruído. Vitor pensou que iria sair fumaça e ela se espalharia
por toda a casa, mas estava enganado, era apenas um pedaço de metal com sete
furos por toda a parte.
Deixou a
arma em cima da cama, pegou Sam e foi embora. Vitor iria viver o mais
intensamente que pudesse, sem pensar mais nos outros, sem se importar mais com
os outros e sem se sentir culpado.
Sua vida
passada inteira estava apagada agora.
Algumas
pessoas iriam se esquecer dele em breve, outras iriam lembrar-se dele pra
sempre pensando onde diabos ele estaria, mas a única certeza que teriam é a de
que ele estaria por aí... Vivendo.
Gustavo Campello
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