Acidentes
acontecem o tempo todo, você pode sair para ir regar o jardim, tropeçar em um
sapo, bater a cabeça e morrer. A vida é cheia de acidentes, alguns são mínimos
e imperceptíveis e outros são enormes e marcam nossas vidas para sempre.
Minha
vida estava indo muito bem, finalmente tinha um emprego que eu adorava, um
salário digno, havia conhecido uma garota chamada Rachel e fui designado para
minha primeira missão no espaço.
“Prender
cabo de segurança 1, soltar cabo de segurança 2” – era só isso que eu tinha que
fazer, mas por um desvio de atenção eu soltei um cabo de segurança antes de
prender o outro. Acidente! - “Burro! Burro! Burro!”
Talvez
meu nascimento tenha sido um acidente, quando pequeno ficava pensando se não
era pra eu ter morrido no parto ou algo assim, que minha existência inteira era
uma aberração da natureza e que só o fato de eu existir iria colocar todo o
mundo em um colapso sem precedentes. Não sei se era pra eu estar vivo ou morto
até agora, mas não acho que minha existência tenha sido tão significativa assim
para a raça humana. Talvez a minha desatenção em prender os cabos de segurança
tenha sido o universo conspirando para me apagar do mapa. Desprendi-me da
estação espacial para morrer vagando pelo universo. Espero que eu não sofra
muito quando o oxigênio acabar ou que eu esteja apagado já por alguma crise de
pânico quando acontecer.
Lembro-me
de uma tarde na piscina, estava só eu e meu avô. Ele tinha sessenta e nove anos e eu ainda
nos meus dezessete. Era final da tarde e meus pais haviam viajado, ele fazia
aulas de natação e estava aprendendo a nadar depois de velho, havia feito uma
cirurgia e se salvado de um câncer e tinha começado a fazer coisas que nunca
havia feito desde então... Nadar era uma delas. Estávamos nos enxugando quando
ele escorregou nos azulejos lisos como sabão, sua cabeça bateu em uma quina e
rapidamente todo o piso branco ficou vermelho, me lembro de segurar sua cabeça
e sentir o seu sangue quente escorrer pelos meus dedos, tentei estancar o
sangue, mas parecia não surtir efeito nenhum.
- Vô!?!?
– eu gritei – está bem?
- Tudo! –
ele disse tentando sorrir. Deve ter percebido que eu estava realmente assustado
como nunca estive na vida.
Minhas
mãos tremiam. Eu ainda tentava estancar o sangue.
- Eu vou
chamar ajuda – eu disse pensando em ir até o vizinho.
- Não,
espera! – Disse ele segurando a minha mão bem forte – não me deixa aqui
sozinho.
Então eu
realmente entendi o que estava acontecendo.
- E
então... – eu perguntei – como realmente está se sentindo?
- Nunca
estive melhor – disse ele – Seja forte, pois esta vida... – então ele hesitou –
...É realmente estranha e maravilhosa.
Eu o
abracei e fiquei assim por um bom tempo, me despedindo. Isto me marcou
profundamente pro resto da vida, tudo o que eu fiz desde então foi tentando não
decepcioná-lo.
Acidentes
acontecem o tempo todo e são estranhos e maravilhosos... Como a vida.
Gustavo
Campello
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