Ficava
boiando na piscina, olhando para cima conseguia ver nuvens bem brancas, bem
longe, quase em outro mundo. Elas estavam lá em cima sendo contempladas por
Vitor, o vento as desmanchava e formavam novas formas. Ele sempre via velhas
nas nuvens, como aquelas bruxas de desenhos animados, com narizes pontudos e
caras maléficas.
Seu
ouvido estava dentro da água e o silêncio era absoluto, gostava disso, era como
se tudo que estava acontecendo tivesse simplesmente parado, alguém tinha
apertado pause e até a gravidade parou de funcionar, Vitor vivia entre os
segundos do relógio naquele momento.
Sua vida
era uma grande piada, se odiava tanto que afastava todas as pessoas com quem se
importava, mas isto não importava naquele momento, porque nada importava
naquele momento, o cheiro de cloro era claro e vinha forte da água. Seu cabelo,
que estava crescendo cada vez mais depois que seu barbeiro havia morrido,
balançava na água e era como se pudesse sentir cada fio, cada movimento da
água. As aranhas podem sentir o movimento do ar com seus pelos ao redor do
corpo e antever qualquer ataque, por isso elas são tão rápidas... Vitor era
naquele momento uma aranha d’água, seus cabelos podiam sentir todo o movimento
da água.
Fechou os
olhos e sentiu o silêncio absoluto, o vazio absoluto, a ausência de tudo... Era
quase a inexistência, entre aqueles segundos do relógio ele simplesmente não
existia e gostava daquilo.
Não
estava feliz.
Não
estava triste.
O
sentimento simplesmente não existia.
Nada
existia.
Nem as
nuvens que estavam a sobrevoar sua cabeça, nem as pessoas em seus trabalhos,
nem a fome, nem sua avó morrendo em um quarto com uma sonda no nariz vitima do
Alzheimer, nem as cagadas que já havia feito, nem a cerveja gelada em sua
geladeira, nem Constance Amiot cantando para ninguém em seu
computador, nem o infinito, nem o vazio, nem seus peixes no aquário, nem o
cloro contaminando a água da piscina, nem seu corpo, nem seus pensamentos...
Nada.
Abriu os
olhos e foi como se os segundos voltassem a andar, seu coração estava apertado
de novo, as pulgas voltavam a devorar seu cachorro, o PH do aquário tinha que
ser controlado. Tudo parecia não fazer o menor sentido, como antes, e Vitor
tentou atingir aquela inexistência novamente sem nenhum sucesso. Saiu da
piscina, ouviu a música que vinha do seu computador, pegou uma cerveja gelada
na geladeira e sentou no chão chorando sem saber exatamente por que.
Gustavo
Campello